Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 21, 2013

Cenários sombrios, uma chance para a presidente - ROLF KUNTZ

O Estado de S.Paulo - 21/12


Nem Papai Noel daria à presidente Dilma Rousseff uma oportunidade melhor depois de três anos de fracasso. Todas as projeções para 2014 apontam mais um ano ruim, com baixo crescimento econômico, inflação alta e grande buraco nas contas externas. Poderá haver algum avanço no investimento - se as concessões forem adiante e começar a execução dos projetos de infraestrutura. Com um pano de fundo tão feio, será fácil exibir e celebrar como vitória qualquer desempenho melhor que o de 2013. Projeções menos sombrias poderiam criar expectativas perigosamente otimistas e sujeitar a candidata à reeleição a cobranças constrangedoras. Os mais otimistas ainda poderão apostar num fator negligenciado nas projeções conhecidas até agora: a mudança ministerial no primeiro bimestre. Mas o otimismo, neste caso, conflita com o conhecimento. A experiência proíbe a esperança, quando se trata de imaginar um Ministério mais competente, depois dessa reforma, e mais orientado para acertar.

A economia brasileira crescerá 2,3% nos quatro trimestres até setembro de 2014, segundo a nova estimativa do Banco Central (BC). Será, portanto, uma repetição do cenário geral de 2013. O quadro apresentado no último informe da Confederação Nacional da Indústria (CNI) é muito parecido, mas um pouco menos luminoso: expansão de 2,4% neste ano e de 2,1% no próximo. As projeções de mercado coletadas pelo BC no dia 13 de dezembro pouco diferem das outras duas: expansão de 2,3% para o produto interno bruto (PIB) neste ano e de 2,01% em 2014 (esses números são medianas das estimativas).

A inflação deve continuar longe da meta, 4,5%, segundo as projeções publicadas até agora. A alta de preços deve ficar em 5,7% neste ano e alcançar 6% no próximo, de acordo com o documento da CNI. As estimativas do BC vão até 2015 e mostram números distantes da meta por mais dois anos. O cenário básico inclui números finais de 5,8% para 2013, 5,6% para 2014 e 5,4% para o ano seguinte. Juros básicos de 10%, recém fixados, câmbio de R$ 2,35 por dólar e contas públicas em condições mais ou menos estáveis foram tomados como base para os cálculos.

Todos esses dados justificam mais um ou dois aumentos da taxa Selic, incluídos na previsão do mercado financeiro para 2014 (já elevada de 10,25% para 10,5%). Pelas contas do mercado, a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), deve ficar em 5,7% neste ano e bater em 5,95% no próximo. Segundo o governo, continuará, portanto, dentro da meta. Patacoada. A meta é 4,5%. O resto é margem para acomodar desvios. Mas desvios tão amplos são justificáveis somente em situações muito especiais. Nada tão especial ocorreu nos últimos três anos ou quatro anos, exceto na coleção de erros de política econômica. Isso inclui, entre outros itens, a redução dos juros no momento impróprio, o excesso de gastos federais e os estímulos mal planejados ao consumo.

Crescimento baseado no incentivo ao consumo é estratégia superada, segundo os analistas menos distraídos e um pouquinho mais atentos aos números de inflação, produção industrial e comércio exterior. É preciso investir muito mais para ampliar a capacidade de produção e o potencial de crescimento da economia. Essa necessidade é agora admitida até no governo, tanto por ministros quanto por uma presidente pouco propensos a reconhecer os desajustes econômicos (eles continuam, por exemplo, classificando como "dentro da meta" qualquer inflação até o limite de 6,5%).

O potencial de crescimento do Brasil caiu de 4,3% ao ano pouco antes da crise global para 2,7% no terceiro trimestre de 2013, segundo estimativa publicada no último informe conjuntural da CNI. Para crescer mais o País precisará de mais capital físico - máquinas, equipamentos e instalações - e de muito mais produtividade. Isso dependerá tanto do setor privado quanto do governo. No ano passado o investimento diminuiu 4%. Deve ter aumentado 7,1% neste ano e poderá crescer mais 5% no próximo, de acordo com o documento da CNI. Se essas estimativas estiverem corretas, o País ainda investirá em 2014 pouco menos de 20% do PIB, bem menos que vários de seus vizinhos. No Equador, por exemplo, essa relação é próxima de 27%.

Na estimativa do BC, o investimento em capital fixo deve ter crescido 6,8% neste ano e deve aumentar 3,7% nos quatro trimestres até o terceiro de 2014. O cenário desenhado pelo pessoal da CNI parece mais bonito, mas é menos atraente quando visto em detalhes. O principal fator positivo deverá ser o programa de concessões na infraestrutura, mas seu impacto imediato será limitado.

Neste ano, o investimento privado foi em boa parte puxado pelas compras de equipamentos de transporte. A lei exigiu motores a diesel com menor emissão de enxofre e, além disso, a boa safra de grãos e oleaginosas favoreceu o aumento das frotas de caminhões e de máquinas agrícolas. As compras de outros tipos de máquinas e equipamentos também cresceram, mas em menor proporção. Isso se reflete no baixo crescimento da indústria de transformação, estimado em 2,3% pela CNI. Reflete-se também no baixo poder de competição do setor industrial, em apuros tanto no exterior quanto no mercado interno. Nem o real desvalorizado compensou a baixa competitividade da maior parte dos produtores de manufaturados.

De janeiro até a segunda semana de dezembro as exportações totais, US$ 230,42 bilhões, foram 1,6% menores que as de um ano antes, pelas médias dos dias úteis. As importações, US$ 230,4 bilhões, foram 6,7% menores. Também isso mostra a fraqueza da economia brasileira e o tamanho do desafio posto diante do governo. Reconhecer o problema, admitir sua origem interna e tentar enfrentá-lo sem os truques baratos do protecionismo será um bom começo.

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