Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 03, 2012

Falhas de comunicação - CELSO MING


O Estado de S.Paulo - 03\11


Durante muito tempo, os economistas repetiram que os bancos centrais lidam com enormes problemas, como juros, câmbio, nível de emprego, atividade econômica, operando uma única alavanca: a da política monetária.

Política monetária nada mais é do que a calibragem do volume de moeda na economia, que qualquer banco central faz por meio da compra e venda de títulos públicos. Se os vende, está retirando moeda em volume equivalente ao que é pago pelo mercado pela aquisição desses títulos. Se, ao contrário, compra títulos, injeta moeda.

Um tanto simplificadamente, o volume de moeda no mercado é determinado pelo seu preço, os juros. Quando puxa os juros para cima, um banco central retira dinheiro do mercado (reduz sua oferta) até o nível dos juros pretendidos; se quer derrubar os juros, tem de baixar seu preço, tem de aumentar o volume de moeda na economia. Como quase sempre é o volume de moeda na economia que determina o preço de mercadorias e serviços, a política monetária é o principal instrumento de controle da inflação. Daí o regime de metas de inflação.

O professor Delfim Netto lembrou em sua coluna de terça-feira no Valor Econômico que não é verdade que um banco central opere apenas a política monetária. Conta ainda com outro poderoso instrumento: a comunicação do que pretende. Se goza de credibilidade, basta manifestar o que deseja para que toda a economia aja de acordo.

Um dos mais reconhecidos especialistas em política monetária, o atual presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), Ben Bernanke, alguns anos antes de assumir seu cargo, dizia que um banco central deve atuar como patrão de um barco a remo. Fica à proa e canta a direção, o ritmo e a força das remadas. Quanto mais integrados forem patrão e remadores, mais eficiente será a condução do barco - ou, no caso, mais eficiente será a política de juros.

Completados quase dois anos da política monetária desta diretoria do Banco Central do Brasil, conduzida pelo economista Alexandre Tombini, pode-se dizer que tem alguma coisa errada aí. Não deixa claro o que quer e não gosta de abrir o jogo sobre as eventuais mudanças de ritmo e de política.

Tudo seria mais claro e mais eficiente se viesse a público dizer que a crise global e o comportamento experimentalista dos grandes bancos centrais obrigam o Banco Central do Brasil a se desviar, ao menos temporariamente, das práticas-padrão de política monetária.

A vantagem desse comportamento seria aproveitar o desaparecimento quase completo da inflação no mercado global e a enorme liquidez dos mercados financeiros, para derrubar os juros básicos (Selic) no Brasil a níveis nunca antes conseguidos. Seria, também, a justificativa pela qual não persegue mais o centro da meta de inflação em cada ano calendário, mesmo que para isso fosse necessário ser alguma coisa mais tolerante com a inflação.

O Banco Central poderia jogar mais limpo com as pessoas e com a sociedade se avisasse que aquela antiga política de câmbio, que tinha por objetivo neutralizar excessiva volatilidade, deu lugar a outra, que gera cotação quase fixa da moeda estrangeira em torno dos R$ 2 por dólar, para dar mais competitividade à indústria.

Enfim, enorme gasto de energia poderia ser evitado se o Banco Central levasse a sério o uso mais adequado do seu outro instrumento de trabalho, a comunicação.

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