Entrevista:O Estado inteligente
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domingo, outubro 07, 2012
Tripé capenga - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 07/10
Não é somente uma vaga impressão. Agora é certeza. O tripé em que se assentava a política econômica do Brasil durante os governos Fernando Henrique e Lula está se desmanchando pouco a pouco.
É possível argumentar que, diante de tanta crise e mudança no mundo, seja natural que o tripé vencedor possa ou mesmo deva sofrer ajustes importantes. O governo Dilma não reconhece que está derrubando paredes e redesenhando a planta da casa. Prefere dizer que são ajustes apenas circunstanciais e que está só trocando os móveis de lugar. Isso mostra a falta de clareza do governo federal. Não consegue mostrar até onde vão as mexidas nem propor, como definitiva, nova modelagem.
O efeito é um grau progressivo de incerteza, cujo reflexo tende a ser a retração do investimento privado.
O primeiro pé do tripé, a meta de inflação, vai sendo sistematicamente "flexibilizado". O Banco Central já não persegue a inflação no centro da meta - neste ano, de 4,5%. Tolera índices bem mais elevados, sugerindo que, mais adiante, retomará o controle. Nas justificativas, é claro, não admite ter desistido. Dá a entender que se trata de descolamento temporário. Nos recados para os agentes econômicos, opta por declarar que "a inflação tende a se deslocar para a meta de forma não linear".
O segundo pé, o câmbio flutuante, foi substituído por um câmbio administrado relativamente fixo, de R$ 2 por dólar. Seu principal problema é a falta de molejo na absorção de choques externos - caso, por exemplo, da alta dos alimentos causada pela seca nos Estados Unidos ou do maior afluxo de moeda estrangeira subsequente às emissões promovidas pelos grandes bancos centrais.
Explicando melhor: a um câmbio fixo, o encarecimento dos alimentos lá fora é transmitido diretamente para o mercado interno, à proporção de R$ 2 por dólar. E a perspectiva de entrada de mais dólares obriga o Banco Central a comprar maiores volumes de moeda estrangeira - o que, por sua vez, exige mais emissão de títulos públicos (mais endividamento bruto).
O terceiro apoio do tripé é a responsabilidade fiscal. Uma de suas disposições é o cumprimento do superávit primário que, em 2012, deveria alcançar R$ 139,8 bilhões, o equivalente a 3,1% do PIB. (Superávit primário é sobra de arrecadação destinada ao pagamento da dívida pública.) Como o PIB encolheu, o governo Dilma desistiu da meta nominal do superávit, medida em reais. Mas, ainda assim, vinha garantindo o cumprimento da meta dos 3,1% do PIB, qualquer que viessem a ser o crescimento econômico e o tamanho do PIB.
A novidade é que o governo federal agora vai abrindo mão também desse objetivo, sob a alegação de que as despesas públicas subiram mais do que a arrecadação e que é preciso fechar as contas. Não está claro qual serão as novas proporções do superávit primário. Mas, já se sabe, além de encolher, vai ser contabilizado com truques já conhecidos, como o de travestir certas despesas de investimento.
Como se viu, por motivos diferentes, o tripé que deu certo antes está sendo preterido por uma mistura de metas flácidas que tornam toda a política econômica mais rígida e o resultado geral bem mais instável.
Apesar de todos os apelos da presidente Dilma para que mobilize o tal espírito animal, o empresário brasileiro se mantém relutante a desengavetar seus projetos de investimento - como mostram tanto os números da Formação Bruta do Capital Fixo das Contas Nacionais quanto o baixo apetite das empresas para compras de máquinas e equipamentos.
Até recentemente, o principal fator que explicava essa resistência do empresário em investir era o alto custo Brasil. Alguns custos têm baixado, é preciso reconhecer. É o caso dos juros e dos encargos sociais cobrados na folha de pagamentos. Mas essa derrubada não tem sido suficientemente vigorosa a ponto de descolar os necessários investimentos.
Agora, a esse entrave, tende a se somar outro: o aumento das incertezas. É um climão geral de desconfiança, não captado em câmeras fotográficas nem em telas de radar, que vai se instalando na economia, a princípio como uma neblina tênue que aos poucos toma corpo.
Nem o governo Dilma sabe ao certo o que fazer com as mudanças. Não sabe se deve voltar ao modelo antigo ou se tem de buscar nova formatação macroeconômica. O risco é que fique mais difícil administrar toda a economia.
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