Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, setembro 05, 2012

Os piores presságios - ROBERTO JEFFERSON



A presidente da Argentina tem rompido ou hostilizado todo e qualquer setor que não se curve aos seus caprichos


Em todo o continente americano, apenas um país sofreu mais que o Brasil o drama de um longo ciclo inflacionário e de sucessivas - e na maioria dos casos fracassadas - tentativas de conter esse que talvez seja o mais perverso fenômeno econômico. Não é preciso ser economista para saber que me refiro à Argentina. Os surtos inflacionários argentinos não foram apenas mais fortes que os brasileiros. Foram também mais difíceis de debelar e, quando isso ocorreu, foi por meio da dolarização indireta da moeda nacional, uma solução que acabaria por gerar um novo problema e levar a Argentina à bancarrota e ao quase colapso institucional no final de 2001. 

As consequências do que ocorreu há pouco mais de dez anos ainda são sentidas pelos argentinos e vão do quase nulo acesso ao crédito internacional ao aumento da pobreza e das desigualdades sociais. A atual presidente, Cristina Kirchner, não é responsável pelo que aconteceu antes que seu finado marido, Néstor Kirchner, e depois ela própria fossem eleitos. Já a manutenção da estabilidade econômica e política tão penosamente conquistada é algo que ela deveria considerar seu compromisso mais sagrado.

É com a maior preocupação que nós brasileiros devemos acompanhar o que se passa na Argentina (até porque pelas relações comerciais bilaterais vigentes, a evolução de sua situação inevitavelmente afeta o desempenho de nossa economia), onde a presidente parece tomada por uma obsessão (auto) destrutiva que só se saciará quando o país mergulhar em nova e tenebrosa crise.

A confirmar esse temor estão decisões, atos e apoios políticos que parecem deliberadamente buscar o caos com a maior eficiência. Em consequência de uma política econômica tão errada quanto irresponsável, a inflação anualizada já anda por volta dos 25%, embora o índice oficial torpemente manipulado não chegue a 10%. O governo gasta fortunas em subsídios paliativos, cada vez menos eficazes, ao mesmo tempo em que caem os investimentos públicos tão necessários à economia sob todos os aspectos.

No plano político, a presidente tem sistematicamente rompido ou hostilizado todo e qualquer setor que não se curve aos seus caprichos. Em compensação, cerca-se e confere poder crescente a "homens de ouro" e a um grupelho de jovens supostamente brilhantes e notavelmente inexperientes e temerários, conhecido como "La Cámpora". Não há a menor chance de dar certo. Como se não bastasse, trata da imprensa como aparelho de propaganda, cooptando a maioria e promovendo uma guerra aos poucos que não se renderam. A última proposta dos "ultra K" (os extremistas kirchneristas -pasmem, mas existem) é a realização de uma reforma constitucional que, entre outras coisas permita a reeleição presidencial sem limites.

Por essas e por outras, Jorge Lanata, o mais talentoso jornalista de sua geração, acaba de exibir em seu programa de televisão uma reportagem feita emCaracas, concluindo que os paralelos entre Argentina e Venezuela "são incríveis", o que confirma os piores presságios.

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