O GLOBO - 09/09
A reclamação de ministros do Supremo de que o revisor Ricardo Lewandowski está encompridando desnecessariamente seus votos, fazendo com que o julgamento possa entrar por novembro adentro, não está relacionada apenas à possibilidade de o presidente do STF, Ayres Britto, ter que se aposentar sem poder participar da discussão da dosimetria das penas.
O perigo maior está em que a parte final do julgamento seja atrasada pela nomeação de dois novos ministros, o que levará a que eventuais penas de condenados sejam adiadas por prazo indeterminado devido a embargos da defesa, que seriam analisados por um plenário diferente do atual.
Os "embargos infringentes" só podem ser apresentados caso o condenado tenha pelo menos quatro votos pela absolvição, pedindo que o processo seja revisto, mas os "embargos de declaração" podem ser feitos a qualquer pretexto, para esclarecimentos de detalhes do acórdão, com a decisão final do STF.
Entre a decisão e a publicação, podem se passar seis meses, como no exemplar caso do deputado federal Natan Donadon, do PMDB de Rondônia, condenado pelo STF a 13 anos de prisão em outubro de 2010 e que continua no exercício do mandato, pois o "embargo de declaração" ainda não foi julgado.
Há outros casos de políticos condenados que permanecem sem cumprir a pena devido a recursos ao STF. O fato de o deputado federal João Paulo Cunha estar ameaçado de ser condenado à perda de mandato evitará que ele continue na Câmara, mas os embargos podem adiar a aplicação das penas.
É quase certo, portanto, que o ministro Ayres Britto tenha que se aposentar antes do final desse tortuoso processo, e o relator Joaquim Barbosa assuma a presidência do STF, uma garantia de que o processo continuará a andar dentro dos mesmos critérios atuais.
Também o novo relator deve ser um dos ministros que já estão atuando, o que, em tese, fará com que não necessite de tempo para se inteirar do processo.
Mas os embargos serão analisados por um plenário diferente do atual, o que pode favorecer alguma mudança de julgamento, ou pelo menos retardar mais ainda o cumprimento das penas.
Nos bastidores de setores petistas que estão sendo punidos pela marcha do julgamento, há um movimento para que a presidente Dilma nomeie ministros ideologicamente ligados ao partido.
A revolta que vem causando nos petistas a atuação da maioria dos ministros no julgamento do mensa-lão se deve ao fato de que, a começar pelo próprio ex-presidente Lula, uma parte ponderável deles considera uma "traição" que ministros indicados por governos petistas possam condenar ações partidárias que consideram, no máximo, parte do que chamam de "luta política".
O ex-presidente teria comentado com amigos que nomeara ministros "sem biografia’,’ que estariam agora querendo marcar suas posições no julgamento. Certamente não se referia a Toffoli, o de biografia menos relevante entre os ministros atuais.
Dos 11 ministros, nada menos que 8 foram nomeados por Lula ou Dilma. Desses, apenas dois — o revisor Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli — têm votado de acordo com a tese oficial, de que o que houve foi apenas caixa 2 eleitoral. Mesmo assim, nenhum dos dois assumiu até agora uma versão final para os fatos, apenas revelando em seus votos a tendência de separar o desvio de dinheiro público, que condenaram, e o uso político desse mesmo dinheiro.
A reação raivosa de setores petistas, como a do próprio presidente do partido, Rui Falcão, homem de confiança do ex-ministro José Dirceu, tem levado a especulações sobre a próxima escolha de novos dois ou três integrantes do STF a ser feita por Dilma, para substituir Cezar Peluso que já se aposentou, Ayres Britto que sai em novembro, e talvez Celso de Mello, que anunciou tendência a antecipar sua aposentadoria ao fim do julgamento do mensalão.
Esses setores obscurantistas do PT querem que as futuras nomeações de Dilma se assemelhem mais ao perfil de Toffoli do que ao de Luis Fux ou ao de Rosa Weber, os dois indicados pela presidente, que têm sido bastante duros em suas decisões até agora.
O que deveria ser motivo de orgulho para um governo democrático, a independência de ministros do STF, passa a ser uma afronta política. Resta ver agora se Dilma está arrependida de seus critérios de nomeação. Seus dois nomeados estão entre os que deram até agora votos mais sólidos.
Entrevista:O Estado inteligente
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