Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 21, 2012

Devagar com a louça José Paulo Kupfer


O Estado de S. Paulo - 21/08/2012
 
 O indicador do Banco Central que antecipa o comportamento da economia, conhecido pela sigla IBC-Br, referente a junho, agitou corações e mentes econômicas. Com uma alta "inesperada" de 0,75% sobre maio, provocou análises e levou a conclusões com ampla dispersão entre os extremos.
Costuma ser assim mesmo nos momentos de transição, quando a economia começa a fechar um ciclo de baixa e a entrar num de alta - e vice-versa. O curioso é que, nesses períodos, nos quais movimentos de alta ou de baixa ainda não se disseminaram pelos setores econômicos, avaliações normalmente situadas em campos opostos acabam convergindo.
Não há diferença entre comemorar a decolagem da economia, como fizeram representantes do governo, e alertar para os riscos de um novo bote inflacionário, como se ouviu de críticos severos da atual política econômica. São ambas avaliações de que a economia reencontrou o rumo de uma expansão forte.
Melhor, porém, ir mais devagar com a louça. Se há, no curto prazo, evidências de que o fundo do vale ficou para trás, nada garante que a economia acumulou fôlego para escalar o pico da montanha. Períodos de transição pedem avaliações muito mais prudentes.
O fato relevante é que, no momento, a economia se move nos espaços hoje estreitos que se abrem, apenas por força de ajustes conjunturais. A inadimplência, por exemplo, estancou. Mas isso, tudo indica, não passa de uma acomodação, que se deveu a fatores restritivos não estruturais.
De um lado, ocorreu uma redução da oferta de crédito e, de outro, perda de capacidade de contrair financiamentos, pelo comprometimento excessivo da renda - não só com as dívidas propriamente ditas, mas com os gastos vinculados ao uso dos bens financiados. Essa acomodação foi suficiente para abrir uma nova ruela de consumo, numa hora em que também houve um repique positivo na abertura de novos postos de trabalho, que ajudou a impulsionar o comércio varejista em junho - e surpreender os analistas com uma alta forte.
Existem sinais de que a recuperação indicada pelo IBC-Br de junho pode se estender aos próximos meses. A expectativa é de uma progressão favorável no segundo semestre, mas numa ascensão suave. Sim, é possível, mesmo a partir de movimentos apenas de acomodação, expandir a atividade econômica. Mas nunca se deve esperar que, nessas circunstâncias, o ritmo de crescimento se apresente sustentadamente robusto.
Um exercício de projeção simples, daqui até o fim do ano, sanciona essa impressão. Caso o IBGE confirme, no fim do mês, os índices antecipados do IBC-Br, o crescimento, no segundo trimestre do ano, terá sido de 0,4% sobre o trimestre anterior.
Esses números mostram evolução semestral de 0,6%. Para crescer em 2012 o tanto que o mercado sinaliza - 1,75%, conforme o Boletim Focus de ontem -, a expansão média, no terceiro e no quarto trimestres do ano, não passaria de 0,6% em cada um deles. Não seria nem a sombra de uma evolução forte - e isso se o resultado final não for ainda menor.
Se, como alardeia o governo - e o mercado, com algum desconto, corrobora -, o crescimento no último trimestre apontará para um ritmo anualizado entre 3,5% e 4% - o que significa expansão de 0,9% a 1% no período -, é aconselhável baixar as expectativas neste terceiro trimestre. Ou, então, se preparar para ver acontecer, com os números de junho deste ano, uma réplica do ocorrido em novembro do ano passado.
Naquele mês, o IBC-Br indicou alta de 1,15% sobre o mês anterior, mas o resultado medido pelo IBGE no trimestre registrou expansão de apenas 0,3%, mostrando que aquele se tratava apenas de um ponto fora da curva. Não custa também colocar no visor a hipótese de um crescimento mais lento do que o até agora previsto, no fim do ano.
A perspectiva relativamente sólida de crescimento moderado no curto prazo permite supor que os temores com relação a um repique da inflação não se encaixam bem no horizonte evolutivo mais provável. E que as chances de extensão do ciclo de cortes nas taxas básicas de juros continuam razoáveis, assim como é possível apostar fichas na prorrogação - e quem sabe até na ampliação - dos estímulos fiscais vigentes.

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