Valor Econômico - 14/06/2012 |
O recente pacote de até €100 bilhões para o resgate dos bancos espanhóis seguiu o padrão dos anteriores: meses de negativas, relutância por parte dos tomadores e, finalmente, o anúncio em meio a certo embaraço por parte do governo resgatado. Dado o histórico pouco estimulante dos resgates passados me pergunto se a mesma sequência de eventos poderia ser tomada como uma profecia (nada lisonjeira) do resultado do pacote. A resposta dos mercados, uma rápida euforia, dissolvida ao longo de um dia, aponta precisamente nessa direção. De fato, embora o resgate possa evitar um desastre de grandes proporções ele não resolve o problema espanhol (ou europeu) e, a depender da definição de alguns pontos importantes, pode reforçar o elo negativo entre problemas bancários e soberanos. Vamos, porém, por partes. Em primeiro lugar deve ficar claro que o pacote não ataca o cerne do problema espanhol, que talvez seja o exemplo mais bem acabado da natureza da crise europeia. Já foi dito, mas vale a pena repetir, que, por mais que as dificuldades ibéricas se manifestem no lado fiscal, sua origem está longe daí. Dependendo da definição de alguns pontos, pacote pode reforçar o elo ruim entre problemas bancários e soberanos Com efeito, a Espanha, antes da crise, registrou seguidos superávits fiscais, resultantes, é verdade, do forte desempenho da arrecadação por conta do seu expressivo crescimento à época. Todavia, segundo as estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), mesmo ajustando o saldo fiscal espanhol ao ciclo econômico, seu déficit estrutural ficou em média próximo a 1% do Produto Interno Bruto (PIB), do início do euro até a eclosão da crise. Para fins de comparação, a Alemanha apresentou déficit estrutural médio pouco inferior a 2,5% do PIB no mesmo período. A dívida do governo espanhol em 2007 atingia modestos 36% do PIB (contra 65% do PIB na Alemanha). Por outro lado, o déficit externo espanhol era da ordem de 10% do PIB às vésperas da crise contra 4% do PIB em 2000. O forte crescimento da demanda interna espanhola, em particular o investimento em construção, foi possibilitado pelo financiamento barato do centro europeu, levando a taxas de inflação sistematicamente mais altas e, portanto, apreciação da sua taxa real de câmbio vis-à-vis à alemã. Isso não foi problema enquanto o capital fluía do centro para a periferia, mas, quando, por conta da crise, houve a reversão, a vulnerabilidade espanhola foi desnudada, em particular a impossibilidade de ajuste rápido da taxa real de câmbio por meio da depreciação da moeda. O que restou à Espanha foi o duro caminho da deflação, ou seja, desemprego e recessão, que, por sua vez, levou à deterioração fiscal. Uma vez que o pacote não endereça, contudo, as dificuldades de ajuste da taxa de câmbio no contexto de uma moeda única, não há motivo para crer que seja a solução para a crise espanhola, nem para países que sofrem problemas semelhantes. É verdade, porém, que o foco do programa é mais limitado, a saber, recapitalizar os bancos para evitar uma crise bancária. Ainda assim há pontos que precisam de esclarecimento urgente. Como notado, o país passou por uma onda extraordinária de construção, financiada por seus bancos, que assim reciclaram os recursos obtidos do centro europeu. Todavia, na esteira da recessão e da queda dos preços de imóveis, a qualidade dos empréstimos se deteriorou consideravelmente. Segundo a mais recente avaliação do FMI, seriam necessários €40 bilhões para que os bancos ibéricos pudessem absorver as perdas de suas carteiras, em particular as imobiliárias, assim como trazer seus níveis de capitalização para os requeridos, emulando a bem-sucedida experiência americana de 2008-09 (Tarp). Nesse sentido os recursos europeus são mais do que bem-vindos, mesmo porque, face às perdas esperadas nas carteiras de crédito, é pouco provável que o setor privado vá fazer este papel. Há, contudo, dois problemas relacionados que podem afetar em muito a efetividade do resgate. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, junho 14, 2012
Um outro punhado de euros Alexandre Schwartsman
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