Valor Econômico - 14/06/2012 |
Tenho certeza que muitos dos leitores desta coluna têm ouvido de familiares ou amigos comentários do tipo: "com rendimentos mensais nos níveis de hoje não vale mais a pena manter meus investimentos em fundos de renda fixa", "depois que os juros mensais caíram abaixo de 1% ao mês não sei mais o que fazer com meus investimentos" ou outras variantes do mesmo tema. Ainda recentemente, li uma notícia neste caderno que, mesmo com juros em queda, o brasileiro ainda espera ganho alto (Valor Econômico, 15/05/12). Não há como negar que o poupador médio no Brasil está viciado em juros altos. Não sem razão. Na época da hiperinflação, os rendimentos nominais eram enormes (apesar de negativos em termos reais) e criavam a falsa sensação de riqueza. Depois, com a estabilização da economia, os juros continuaram muito altos (desta vez também em termos reais) durante muito tempo. Foram décadas de convívio com rendimentos mensais fora de qualquer padrão de comparação internacional. Bastava investir em títulos públicos federais (ou em fundos de investimentos de renda fixa ou DI com lastro nestes títulos) e deixar o tempo passar. Difícil não se viciar. A má notícia para nossos amigos saudosistas é que esse ambiente mais difícil para investimentos aparentemente veio para ficar. Mesmo que o Banco Central (BC) seja obrigado a puxar os juros de curto prazo para cima em algum momento no futuro (o que não deve ser descartado de maneira alguma), é bastante provável que esse aumento não devolva a taxa Selic para os confortáveis níveis de outrora. Mas será mesmo que não é possível ver os juros domésticos voltando para níveis observados há apenas um ou dois anos atrás? A verdade é que a economia brasileira passou por uma série de mudanças estruturais nas últimas décadas que sugerem que o país está se tornando mais "normal". Essas mudanças passam pela a manutenção de um sistema de metas de inflação que, bem ou mal, ajudou a manter preços domésticos relativamente controlados por mais de uma década, pela redução significativa da dependência da economia brasileira ao financiamento externo (e a consequente redução do famoso prêmio pelo risco Brasil) e pelo aumento da penetração de crédito na economia (saindo de um patamar próximo a 22% do PIB em 2002 para algo em torno de 47% em 2011). Em suma, a conjunção de diversos fatores aparentemente não correlacionados criou uma situação onde o lado real da economia tornou-se mais sensível a mudanças na taxa de juros de curto prazo. Nesse cenário, mudanças menores nos juros tendem a afetar a economia de maneira mais aguda que no passado, ajudando o Banco Central em sua tarefa de desacelerar o crescimento em momentos de alta consistente de preços domésticos. Em outras palavras, o choque de juros necessário para manter a inflação sob controle em um ambiente de crescimento acelerado é muito menor hoje do que foi no passado. Taxas de juros muito acima de 10% por um longo período de tempo ficarão cada vez mais raras. Voltamos assim à questão inicial desta coluna: o que fazer com meus investimentos para que os retornos sejam compatíveis com o que eu estava acostumado? Existe uma expressão em inglês que se aplica muito bem a este caso: "no pain, no gain" (uma tradução não literal poderia ser: "sem sacrifício não há benefício"). É exatamente isso que o aplicador local vai ter que fazer: sofrer um pouco. Acostumado a obter retornos muito acima da média global sem assumir riscos de perdas relevantes em seus investimentos, o brasileiro tinha diante de si um cenário de sonhos: muito retorno e pouco risco. Infelizmente, o mundo mudou. Se o aplicador local quiser manter o nível de retorno de seus investimentos em patamares próximos àqueles do passado só existe uma solução possível: assumir maiores riscos de perdas em seus investimentos para ter a chance de obter retornos maiores. O investidor deve se preparar para olhar seu extrato bancário no final de cada mês e, ocasionalmente, ver o saldo de seus investimentos cair de um mês para outro. Aumentar o risco da carteira é a única maneira comprovada de obter retornos mais altos de maneira consistente. Pode parecer trivial, mas representa uma grande mudança em relação a um cenário onde aplicações em fundos de renda fixa (ou indexados ao CDI) representavam uma parcela relevante dos investimentos totais. Quais são, então, as alternativas possíveis para um investidor local aumentar o risco de sua carteira de maneira inteligente e, no médio prazo, obter retornos mais atrativos? Três alternativas aparecem como as mais atrativas no momento atual. A primeira seria alongar o prazo de vencimento médio (ou duração) dos investimentos. Ao abdicar de liquidez no curto prazo em favor de títulos mais longos, o investidor deveria ser recompensado por isso. A segunda seria aumentar a proporção dos ativos de crédito privado em relação aos investimentos totais. Em particular, vale mencionar a possibilidade de se investir em veículos de crédito estruturado como Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Letras de Crédito Agrícola (LCAs). Por último (e talvez a mais controversa de todas) há a possibilidade de se aumentar a proporção de investimentos em ações em relação ao total. Cada uma dessas alternativas apresenta alguns pontos favoráveis e outros desfavoráveis. Mas este é um tópico que eu volto a abordar em um outro momento oportuno. Paulo Clini é diretor de Investimentos da Western Asset Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, junho 14, 2012
Juros abaixo de 9% ao ano. O que fazer? Paulo Clini
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