Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 24, 2012

Diferenças - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 24/06
A diferença entre o que aconteceu no Paraguai e um golpe parlamentar está em que a Constituição do país não foi alterada em uma vírgula para que o processo de impeachment fosse votado.O fato é que o agora ex-presidente Fernando Lugo já não contava com apoio político, pois o pedido de impeachment, liderado pelo oposicionista Partido Colorado, foi aprovado por 76 votos a favor e um contra, com três abstenções.
Em seguida, o Senado aprovou a deposição de Lugo, "por mau desempenho do cargo", com 39 votos contra 4. Essas votações demonstram que não houve um partido majoritário que impusesse uma manobra política contra o governo. O que havia era um consenso da classe política de que a ingovernabilidade chegara a seu limite.

Ao mesmo tempo, a crise econômica que o país vive ajudou a engrossar o caldo de crise política que vinha se desenhando há muito tempo.

Depois de ter um crescimento espetacular em 2010, de 15% do PIB, a previsão para este ano é de um crescimento negativo de 1,5%.

Teria havido um "golpe parlamentar" caso alguma alteração constitucional feita sob medida proporcionasse à maioria depor o presidente.

A crítica cabível é quanto à celeridade do processo, que leva à suspeita de que etapas foram suprimidas ou encurtadas para que a decisão final fosse alcançada no menor prazo possível.

Processos políticos, no entanto, têm essa característica, e aqui mesmo no Brasil tivemos o exemplo na deposição de Collor. Mesmo depois de ter renunciado, o Senado continuou seu julgamento político e ele foi cassado.

Se o presidente deposto recorrer contra o "rito sumário" à Justiça, caberá a ela a decisão final, dentro dos ritos democráticos. Se a Justiça paraguaia entender, como muitos estão entendendo, que houve atropelo ao direito de defesa e o devido processo legal não foi obedecido, caberá ao Congresso aceitar a decisão e reiniciar o processo de impeachment.

A pífia participação dos Estados Unidos na Rio+20, coroada com a presença-relâmpago da secretária de Estado Hillary Clinton, por cerca de 15 horas na cidade, é demonstração evidente de como a mistura de campanha eleitoral com crise econômica interferiu nos resultados finais da reunião.

Nos mínimos detalhes, a ausência dos americanos prejudicou os resultados, como na reunião do Rio Climate Challenge (Rio-Clima), que previa uma "negociação simulada" entre os principais países emissores e alguns dos mais vulneráveis, com a participação de atores supranacionais: agências multilaterais, ONGs, multinacionais, capital financeiro, movimento sindical.

O objetivo seria chegar a um shelf agreement (acordo simbólico preparatório) em torno do limite de 450 partes por milhão (ppm) para manter o aquecimento médio do planeta neste século em dois graus, seguindo o IPCC.

Pois faltou "massa crítica" para a realização de tal evento, na definição do deputado federal Alfredo Sirkis, do PV, sobretudo em relação aos americanos.

Vários senadores e deputados, entre eles o democrata John Kerry, ex-candidato à Presidência dos EUA, e a republicana Susan Collins, "declinaram gentilmente, alegando importantes afazeres em Washington, ou não responderam".

Sirkis chegou à conclusão de que "viajar para discutir temas ambientais não é eleitoralmente bom para nenhum deles neste período pré-campanha".

Também na parte de governança não houve avanço na Rio+20 por causa da crise na zona do euro e da campanha eleitoral americana, mas a reunião do Rio-Clima recomendou que as negociações se estendam ao G-20, e que se institua um totem, um tipo de "termômetro global" nas praças e ruas das principais cidades de todo o mundo, assinalando mensalmente a progressão da concentração de gases de efeito estufa rumo à marca crítica das 450 ppm.

Sirkis explica que o Rio-Clima pretende instituir-se como um think tank permanente sobre clima, baseado no Rio, onde foi assinada a Convenção do Clima, em 1992.

Mesmo sem a negociação simulada, a iniciativa do Rio-Clima pode ser considerada com saldo positivo, diz Sirkis, pois "veio gente de alto nível de 14 países com destaque para a atual secretária e os ex-secretários-executivos da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre mudanças climáticas, (UN FCCC) Christiana Figueres e Ivo de Boer".

Ficaram prontas as "recomendações" para a Rio+20 e a COP 18, que se realizará em novembro, no Qatar. O Rio-Clima trabalhou as simulações e o processo de decisão com um software do MIT, para simular influência de medidas concretas no aumento da temperatura média do planeta, e um programa desenvolvido pelo professor Carlos Bana e Costa, um dos "facilitadores" do debate, na London School of Economics.

Cinco grandes propostas foram formuladas para qualificar os passos iniciais rumo a uma "economia verde":

1 - Rever o PIB como indicador-mor e fetiche do desenvolvimento.

2 - Reformar sistemas de tributos/subsídios ambiental e socialmente regressivos, substituindo-os pela taxação da intensidade de carbono. Acabar com os subsídios aos derivados de petróleo, e alocar boa parte desta verba para compensação social para enfrentar aumentos de preços que isto provocaria.

3 - Um New Deal verde planetário: um grande investimento público de governos e bancos multilaterais em inovação tecnológica, energias limpas, megarreflorestamentos, reconversão de sistemas de transporte e saneamento básico, gerando milhões de empregos.

4 - Reconhecer o valor econômico dos serviços ambientais prestados pelos ecossistemas.

5 - Uma "Bretton Woods do baixo carbono" para uma nova ordem financeira global, com produtos financeiros e conversibilidade de moedas lastreados na redução de carbono, tentando trazer parte destes trilhões de dólares da bolha financeira internacional para uma economia produtiva de baixo carbono.

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