Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 08, 2011

Está quente MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 08/11/11

O secretário de Desenvolvimento do Rio, Julio Bueno, diz que recebe uma visita por dia de empresário anunciando investimento; o Instituto de Desenvolvimento do Varejo conta que as grandes lojas continuam com vendas aquecidas; a Zona Franca de Manaus continua trabalhando em ritmo acelerado; produtores de máquinas reclamam da concorrência chinesa.

A economia brasileira está com crescimento forte em vários setores mas está com problemas, em outros. O varejo continua dizendo que sente uma pressão forte da demanda; alguns segmentos industriais reclamam e reduzem investimento por causa do câmbio. Para saber se a economia está fria ou quente, não basta tomar a temperatura uma única vez.

Uma das complicações é a comparação com anos anteriores. Este ano, o Carnaval foi em março, a Semana Santa, em abril. O economista José Roberto Mendonça de Barros disse que teve que tirar os efeitos sazonais dos dados e ponderar por dia útil. Assim, chegou à conclusão de que, apesar de se falar que está havendo desaceleração forte em automóveis, de janeiro a abril do ano passado houve 12.300 emplacamentos novos por dia; este ano, foram 12.200. Ou seja, praticamente não houve queda. A média de abril foi de 13.800:

— Isso em parte é tocado pelo aumento de salário. O salário inicial do comércio subiu 10% real; o da construção civil, 6,6%.

Ele constata nas conversas nas empresas e nos indicadores que o país continua crescendo. O IBC-Br, o índice de atividade econômica do Banco Central, por exemplo, teve alta de 1,3% no primeiro bimestre; o que anualizado dá 5% de crescimento.

— Nós estamos mantendo a previsão de 4,5% de crescimento este ano — diz.

Outros economistas e consultorias já fizeram revisão para níveis mais baixos, mas isso significa que o ritmo terá que cair muito nos próximos meses porque o ambiente parece aquecido para quem conversa com empresas do varejo.

A diretora-executiva do IDV, Fabíola Xavier, disse que para o comércio o crescimento continua:

— Houve uma pequena queda em março, mas o varejo continua crescendo numa média de 7%. Em geração de emprego, foi o melhor fevereiro desde 2003. Não chega a faltar produto, mas temos que correr para atender à demanda. E as empresas continuam abrindo lojas.

Eu perguntei em que áreas, ela disse que em bens de consumo duráveis, informática, papelaria, vestuário. Setores em geral.

Nas conversas entre o varejo e a indústria, no entanto, há muita reclamação sobre o câmbio. Várias empresas reclamam da dificuldade de competir com os importados.

A agronegócio está entrando na safra em momento de alta de preços de diversas commodities. Soja, açúcar, café, carne, vários produtos estão subindo. O café está com o melhor preço desde 1975, segundo Mendonça de Barros. E a soja brasileira é beneficiada pela queda da produção da Argentina. Mas ontem mesmo a informação do pólo de colheitadeiras no Rio Grande do Sul era de que estavam começando as demissões pela dificuldade de competir com as máquinas importadas da China.

O presidente do Sindicato das Indústrias de Aparelhos Elétricos, Eletrônicos e Similares de Manaus, Wilson Périco, contou que o setor está buscando alternativas ao fornecimento de peças do Japão, mas garante que até agora ninguém parou pela crise japonesa decorrente do terremoto, tsunami e desastre nuclear. Mas a Toyota anunciou ontem que vai parar temporariamente a produção no país durante uma parte do mês de maio. No mês passado, a queda da produção da empresa foi de 62%. Produziu no mesmo nível de 1976.

Assim está a economia brasileira, com vários sinais contraditórios. O BC baixou medidas para conter o crédito, mas o consumidor enquanto pode continua comprando. Foi elevado o IOF nas compras a crédito, mas o brasileiro sabe muito bem como contornar esse obstáculo: compra nos cheques pré-datados.

O presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, disse que esteve recentemente com várias empresas e todos estão comemorando o ritmo.

— Conversei com sete sindicatos do setor de metal-mecânico e todo mundo está sorrindo. Tenho falado com empresas do interior que estão fazendo investimento até em design de produto. Na Região Serrana atingida pelas chuvas as empresas pegaram empréstimos que esgotaram a linha de R$ 400 milhões oferecida a eles e estamos pedindo uma ampliação desse financiamento — diz o empresário.

O mesmo otimismo que se vê em Julio Bueno sobre o crescimento do Rio:

— Um dia, recebo a Rolls-Royce falando em investir aqui; no dia seguinte, a Nestlé avisa que pensa em se instalar em Três Rios; a Alpargatas quer vir para o Rio. Há 120 empresas candidatas ao nosso incentivo. Há muito interesse em instalação de térmicas a gás no Rio ou de instalação de empresas para fornecer para a Petrobras. Com o ciclo das commodities, o Rio se beneficia exatamente por ser um exportador de commodities. Isso sem falar nos eventos na cidade. Há 16 a 17 hotéis vindo para o Rio.

Uma das vantagens que o Rio está tendo é com a alta do petróleo, porque a receita de impostos é derivada do preço internacional. O estado fez o orçamento com base em US$ 65 o barril e ele está chegando a US$ 130.

Todas as pessoas com as quais falei ontem admitiram que um problema ronda todo esse bom momento: a inflação. Mendonça de Barros contou que recentemente uma empresa mostrou a ele todos os seus itens de custos. Todos haviam subido fortemente. Como há demanda para os seus produtos, ela repassará para os preços.

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