Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, maio 31, 2011

Gato e rato - Celso Ming

O Estado de S. Paulo - 31/05/2011
 

Na última sexta-feira, o economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, Olivier Blanchard, advertiu, no Rio, que um bom pedaço do Investimento Estrangeiro Direto (IED) que tem desembarcado no Brasil é especulação com juros e nada tem de investimento.

Explica-se: para evitar a excessiva valorização do real (baixa acentuada do dólar), o governo impôs um pedágio de 6% em Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) à entrada de capitais destinados a aplicações em renda fixa. É um dinheiro obtido lá fora, a juros muito baixos, que vem para o Brasil para ganhar no mole uma remuneração alentada de 12% ao ano.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vinha festejando o sucesso dessa taxação, uma vez que as estatísticas mostraram forte retração da entrada de dólares para aplicação em renda fixa. No entanto, o IED - isento do IOF de 6% - está disparando. Nos últimos 12 meses terminados em abril, entraram nada menos que US$ 63,7 bilhões. E não será nenhuma surpresa se, no fim do ano, tiverem ultrapassado os US$ 70 bilhões. Mantega chegou a festejar essa força do investimento estrangeiro que, imaginava ele, vinha para cá para concorrer para o aumento da produção e para a criação do emprego. Mas Blanchard avisa que boa parte é investimento disfarçado e sugere que toda entrada de quantias no País seja sujeita ao IOF.

Um grande número de estudos mostrou que dinheiro é como água. Se alguém tapa um buraco, ela vaza por outro. Ou seja, é muito complicado pretender controlar o fluxo de capitais.

É provável que bom volume de IED não precisaria vir como IED no Brasil, porque a empresa aqui instalada já dispõe de caixa suficiente para fazer o investimento. Mas a diferença entre juros internos e externos define como excelente negócio trazer o investimento estrangeiro e, enquanto isso, aplicar o caixa no mercado financeiro. E tem mais: com os juros assim, os capitais que normalmente não saem ficam por aqui, tirando proveito dos juros. E, no entanto, não há como cobrar um IOF sobre capitais que não saem do País.

Mas não é só por meio do IED que esses capitais vazam para o Brasil. O forte crescimento das exportações também leva jeito de conter a entrada disfarçada de dólares. É provável que o superávit comercial deste ano ultrapasse os US$ 30 bilhões. Só nessas duas contas (IED e balança comercial), o Brasil poderá apontar uma entrada líquida de dólares não sujeita ao IOF de nada menos que US$ 100 bilhões.

O Brasil precisa desesperadamente de investimentos externos para desenvolver o pré-sal, o PAC, as obras da Copa do Mundo e da Olimpíada. E carece de força nas exportações. Não pode passar ao mercado o recado de que não quer esses recursos. Monitorar e fiscalizar investimentos estrangeiros e exportações é briga de gato e rato. A Receita Federal, que não tem como controlar nem a entrada de contêineres no País, não terá como farejar essa chegada clandestina de recursos. Os anos 70 e 80 mostraram que laçar boi no pasto, os fiscais do Sarney e essas políticas voluntaristas são como fazer buraco em água. Se o governo quer eficiência ao controlar fluxos de capital, tem de derrubar corajosamente os juros. Mas, para isso, será preciso mais disciplina orçamentária, para que a dívida possa cair e levar os juros consigo.

CONFIRA

Em 12 meses, o saldo das operações de crédito continua crescendo muito acima do que o próprio Banco Central vem apontando como adequado: 21%, em vez de 13%. É o que está no gráfico acima. Esse é um sinal de que o consumo continua excessivamente aquecido.

IGP-M de abril
A variação de um mês para o outro não foi muito significativa: 0,43%, em maio, e 0,45%, em abril. A novidade é que a sua evolução em maio foi bem mais baixa do que a esperada, puxada para baixo pelos preços agrícolas no mercado atacadista.

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