Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 26, 2009

IPO do Santander: a economia brasileira está a todo o vapor

A volta com força total

Os investidores estrangeiros retomam o nível pré-crise
das aplicações na economia brasileira – considerada
uma das mais promissoras no mundo pós-crise


Benedito Sverberi

Fernando Banos/AFP

A VEZ DO BRASIL
O espanhol Emilio Botín, presidente mundial do Santander: captação
de até 8,7 bilhões de dólares para ampliar a oferta de crédito no país


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No fim do ano passado, os investidores estrangeiros haviam retirado maciçamente os recursos que tinham aplicado no Brasil. Eles precisavam de seus dólares para cobrir perdas em seu país de origem, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa, e também temiam que o Brasil pudesse ser atingido mais intensamente pela crise internacional. Passado o pânico, os dólares começaram a retornar. A principal fonte de capital têm sido os investimentos diretos, aqueles aplicados na expansão de fábricas e na compra de empresas – um termômetro do otimismo dos estrangeiros em relação às perspectivas do país. As exportações, beneficiadas pela rápida recuperação na Ásia, também continuam a irrigar a economia. Agora é a vez de a bolsa de valores retomar importância como fonte de recursos. O retorno dos investidores fez com que o Ibovespa, índice que mede o desempenho das principais ações negociadas na Bolsa de São Paulo, subisse 60% em 2009. Medida em dólares, a alta ultrapassou os 100% – ficou entre as maiores do mundo. O bom momento não deve parar por aí. Motivadas pela renovação do interesse dos estrangeiros, diversas empresas decidiram abrir o seu capital e estrear na bolsa ainda neste ano. Estão previstas seis ofertas públicas de ações, que deverão trazer 8 bilhões de dólares para o país.

Da lista de companhias prestes a lançar ações na Bovespa, o negócio mais significativo será protagonizado pela subsidiária brasileira do banco espanhol Santander. A instituição deverá realizar a maior oferta pública da história do mercado de capitais nacional. A operação poderá atingir 8,7 bilhões de dólares, se a demanda pelas ações do lote inicial, que será leiloado em 8 de outubro, superar as expectativas e os lotes adicionais também forem vendidos. Estima-se que será a maior abertura de capital do mundo neste ano, superando a da estatal chinesa de construção civil CSCEC, que captou 7,3 bilhões de dólares. O Santander pretende crescer no mercado nacional tanto pelo aumento de sua presença física – há planos de abrir 600 agências até 2013 – quanto pela oferta de crédito. A instituição quer ampliar a concessão de empréstimos imobiliários, setor no qual já é líder entre os bancos privados. "A opção do Santander demonstra a confiança do grupo na economia, no consumo interno e no crédito do Brasil", avalia o professor de finanças da Fundação Getulio Vargas Ricardo Araújo. Assim, o banco se credencia para acirrar a concorrência com os atuais líderes entre os bancos privados, o Itaú Unibanco e o Bradesco. O lançamento das ações contribuirá para a diversificação de opções disponíveis para aqueles investidores interessados em aplicar recursos nos papéis do setor financeiro. "O Santander é uma empresa global, que deverá atrair investidores estrangeiros que ainda não aplicam na bolsa brasileira", diz o presidente executivo do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri), Geraldo Soares.

Exceto por um novo agravamento na turbulência financeira internacional, a afluência de dólares para o país não deverá cessar nos próximos meses. Há a avaliação de que o Brasil passou pelo teste da crise e agora deverá acelerar o crescimento e atrair mais investimentos. Prova disso é que a agência Moody’s comunicou na semana passada que elevou a avaliação do Brasil à categoria de grau de investimento. Nenhum outro país havia sido promovido desde o estouro da crise. "O Brasil saiu-se bem, o que reafirmou a percepção de que as reformas feitas nos últimos anos e a boa condução da política econômica consolidaram nossa estabilidade", diz o estrategista-chefe do banco WestLB, Roberto Padovani. "Temos também um mercado consumidor enorme. Os investidores, mesmo com menos recursos, olham as opções de países para aplicar e concluem que o Brasil está entre os melhores."

A tendência, diante desse quadro favorável, é que a moeda americana se desvalorize em relação ao real. Desde janeiro, a cotação do dólar recuou 23%. Para alguns economistas – uma minoria, registre-se –, essa queda se deve aos juros ainda elevados do país. Mas os números não corroboram a tese. Se ela fosse verdadeira, seria bem mais expressiva a entrada de capitais no país com destino aos investimentos em renda fixa – aplicações em títulos públicos e privados. Entre janeiro e agosto, apenas 2,6 bilhões de dólares ingressaram por esse canal, muito menos do que trouxeram os investimentos diretos, o comércio externo e a bolsa, que, somados, atraíram 55 bilhões de dólares (veja o quadro). Na avaliação majoritária dos economistas, o fortalecimento do real é um corolário dos avanços da economia e das boas perspectivas para os próximos anos. Como exemplo, bilhões de dólares serão gastos na preparação para a Copa do Mundo de 2014 e na exploração das jazidas do pré-sal. Existem ainda grandes chances de o Rio ser escolhido como sede da Olimpíada de 2016 (o anúncio sairá na próxima sexta-feira, 2 de outubro), o que exigiria a execução de mais investimentos em infraestrutura. O resultado é que, depois de uma geração perdida devido à crise da dívida externa e à tragédia da hiperinflação, o país retomou uma velocidade de crescimento acima da média mundial e se vê diante da possibilidade de reduzir o fosso que o separa das nações desenvolvidas. Para isso, no entanto, terá de utilizar de maneira sábia e produtiva os dólares que voltaram a irrigar a economia e não desperdiçá-los na gastança do inchaço da máquina pública.

Com reportagem de Luís Guilherme Barrucho


Mais um reconhecimento

O Brasil recebeu na semana passada mais um atestado de sua maturidade na administração da política econômica. A Moody’s, uma das três grandes agências globais de avaliação de risco (ou de rating), decidiu elevar a classificação dos títulos da dívida brasileira em moeda estrangeira para a nota Baa3. Na sopa de letras com a qual essa empresa julga a capacidade de um país ou uma empresa honrar as suas dívidas, essa nota representa o ingresso brasileiro à condição de "grau de investimento". Apesar de o Brasil já ter obtido anteriormente avaliação semelhante das outras duas agências, a promoção conquistada agora é significativa porque foi a única concedida a algum país desde o início da crise. Em termos práticos, a obtenção dessa chancela representa a possibilidade de atrair um maior número de investidores estrangeiros e de melhor qualidade, com disposição para efetuar aplicações de longo prazo. Muitos fundos de investimento estrangeiros estão impedidos, por seus estatutos, de aplicar recursos em nações que não possuam esse selo. Alguns regulamentos são ainda mais rígidos: só permitem investimentos num país que obtenha o grau de investimento das três principais agências. Em resumo, com a nota da Moody’s, foi eliminada a última barreira para que mais dinheiro aporte na economia brasileira.

As classificações realizadas pelas agências de rating seguem uma extensa escala gradativa. A nota máxima é AAA, da qual estamos separados por nove degraus. Mas o Brasil possui ainda notas inferiores, por exemplo, às do México e da Rússia, países muito mais fortemente afetados pela crise e que, nos contratos internacionais, têm sido avaliados como de maior risco. "Essas agências estão atrasadas. Nos mercados financeiros internacionais, o Brasil tinha uma avaliação melhor fazia muito tempo", afirma o economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Gold-fajn. Chama atenção ainda o fato de o país não ter uma nota melhor apesar de ser, desde janeiro do ano passado, credor externo líquido (ou seja, os ativos brasileiros no exterior superam a dívida externa). Diz Goldfajn: "O fato de o Brasil ser credor externo é muito bom, mas outros fatores também são avaliados, como as perspectivas da política fiscal".

Nesse sentido, os analistas estão de olho na saúde das contas públicas, que, ironicamente, piorou bastante neste ano em razão da queda na arrecadação e do aumento nos gastos. "A Moody’s nos deu um voto de confiança. A aposta é que a piora na política fiscal será transitória, principalmente porque o país se encontra num período pré-eleitoral e acaba de sair de uma crise", analisa o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale. Logo, o grau de investimento é uma conquista e tanto, mas não significa que será definitiva. O esforço irá por terra se não se preservar o rigor fiscal.

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