Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, julho 30, 2009

Celso Ming Não é mais o mesmo


O Estado de S. Paulo - 30/07/2009
 


Os ministros da área econômica têm insistido em que obsessão por rigor nas contas públicas é ladainha sem sentido. E, quando aparecem números deteriorados, martelam que são coisas passageiras. O problema é que essas coisas produzem consequência. 

Ontem, o governo federal apresentou um resultado fiscal (que engloba arrecadação e despesa) derrapante. Em junho, o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) foi de apenas R$ 3,4 bilhões, ou 67% menor do que o obtido em junho de 2008 e 57% mais baixo na acumulada deste ano em relação à acumulada do ano passado. Além disso, a dívida líquida do setor público, que era de 38,8% do PIB em dezembro, saltou para 43,1% do PIB em junho.

Dois fatores contribuíram para a deterioração. O primeiro foi a quebra da atividade econômica em consequência da crise. Menos consumo e menos produção implicam menos vendas e menos renda. E, quando isso ocorre, a arrecadação sofre. Já se sabia há dias pelos números da Receita Federal que, nos primeiros seis meses deste ano, a arrecadação do governo federal despencou 7% com relação ao mesmo período de 2008. 

Mas a arrecadação não caiu só porque houve o impacto da crise. Caiu, também, porque o governo reduziu os impostos em alguns setores-chave da indústria, especialmente nas vendas de veículos e de aparelhos domésticos.

O segundo fator que derrubou o superávit primário foi o grande aumento das despesas correntes do governo. Os gastos com o funcionalismo público, por exemplo, estão crescendo 21% neste ano. As transferências de recursos para os projetos sociais (especialmente cesta básica) aumentaram 12%. 

Muita gente no governo avisa que este pulo está nas recomendações do grande John Keynes, o maior economista do século 20, que receitava aumento das despesas públicas em tempo de crise. Mas os ossos de Keynes devem contorcer-se na tumba ao serem pronunciadas palavras assim porque ele jamais indicou despesas dessa qualidade. O que ele propunha como alavanca de superação da crise era o aumento dos investimentos públicos em projetos de infraestrutura, cujo resultado permanecesse para sempre, e não essa operação da mão pra boca de que o governo se gaba por incluí-las nas suas iniciativas anticíclicas.

O ministro Guido Mantega entendeu que precisaria tranquilizar aqueles que identificam uma forte tendência à gastança federal. Reconhece que há um forte aumento das despesas de custeio, mas avisa que, nas circunstâncias, "não é necessariamente negativo". Ao contrário, ainda que lamente ter quebrado os ovos, Mantega festeja a omelete obtida. Para ele, China e Brasil conseguiram os melhores resultados com os pacotes fiscais adotados para combater a crise.

Em sete anos, o governo Lula não produziu nenhuma grande besteira fiscal. Seus excelentes resultados na economia e nas urnas se deveram primordialmente à responsabilidade orçamentária com que vinha conduzindo as finanças. O problema é que o calendário político vai apontando para outubro de 2010 e o risco de que a administração Lula descambe para o vale-tudo fiscal de modo a garantir a aliança partidária e a eleição do sucessor parece assustadoramente alto. 

Piorou, e daí? ? O gráfico dá a ideia de quanto aumentou a dívida. Mas o mercado não parece preocupado. Ontem mostrou demanda de US$ 7 bilhões para uma emissão externa de títulos do Tesouro, de 30 anos, de apenas US$ 500 milhões.

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