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sábado, junho 27, 2009

A Criação da Juventude, de Jon Savage

da Veja

Livros
A PRÉ-HISTÓRIA DOS TEENS

O crítico musical inglês Jon Savage segue a evolução
dos movimentos adolescentes - de gangues do fim do
século XIX aos swingers dos anos 30 e 40 - e mostra 
que a rebeldia começa bem antes do rock


Sérgio Martins

Gene Lester/Getty Images
VOZ DA AMÉRICA
Frank Sinatra nos anos 40: sempre cercado de fãs histéricas que até jogavam calcinhas no palco, ele despertou a indústria do entretenimento para o público juvenil


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Frank Sinatra costuma ser lembrado como o senhor de voz impecável e olhos azuis que fez gravações definitivas de My Way Strangers in the Night - standards que dificilmente se encontram no iPod da garotada. Nos anos 40, porém, o jovem Sinatra foi um ídolo adolescente no molde dos Jonas Brothers. Arrancava gritos histéricos das fãs (as mais ousadas até jogavam calcinhas no palco). Sua ascensão ao estrelato ocupa o capítulo final de A Criação da Juventude (tradução de Talita M. Rodrigues; Rocco; 560 páginas; 84 reais), do crítico inglês Jon Savage. Na visão do autor, Sinatra e suas plateias de garotos eram a síntese exata de um novo espírito americano, hedonista e autoconfiante, que emergia da vitória na II Guerra Mundial. Mais importante, o sucesso do cantor consolidaria a ideia de uma cultura especificamente jovem, que nas décadas seguintes - a era do rock e do pop - seria o motor da indústria do entretenimento. A gestação desses valores juvenis foi longa e acidentada, como o livro de Savage demonstra exemplarmente. Contrariando o lugar-comum que atribui ao rock dos anos 50 e 60 a primazia das revoltas juvenis, o crítico desvela uma tradição esquecida de movimentos sociais, políticos e artísticos que no século XX levantaram, para o bem e para o mal, a bandeira da rebeldia.

Hoje com 55 anos, Savage é autor de uma história do grupo Sex Pistols - England's Dreaming, de 1991, obra definitiva sobre o movimento punk na Inglaterra. A Criação da Juventude é um livro mais ambicioso, mas tem lacunas sérias: a crítica cultural Camille Paglia, em uma resenha no jornal The New York Times,observou que o repertório literário de Savage é meio frouxo. O movimento romântico, pioneiro na valorização da angústia juvenil, aparece muito de passagem no seu livro. É na cultura popular que Savage está em casa. Seu ensaio histórico traz retratos vigorosos das tribos urbanas formadas pelos jovens a partir do século XIX. "Para a minha surpresa, muitos desses grupos tinham ideais e comportamentos semelhantes aos dos punks", disse Savage a VEJA. O cinismo anárquico dos punks já aparecia quase um século antes entre gangues nas periferias das grandes cidades. Tal foi o caso dos delinquentes juvenis que, na Paris do fim do século XIX e início do XX, ficariam conhecidos como "apaches" (o nome surgiu de um artigo no Le Matin, forçando uma analogia com os nativos "selvagens" dos Estados Unidos). Dedicados às brigas de rua e aos pequenos furtos, os Apaches também davam importância ao estilo de suas roupas e danças. Essa afirmação da identidade através da vestimenta seria comum a todas as tribos juvenis.

Divulgação
HISTORIADOR PUNK
O inglês Jon Savage: desprezo por Nick Hornby e pelos "tiozinhos" que vivem como adolescentes

A necessidade de pertencimento a um grupo, tão própria da psicologia adolescente, seria manipulada politicamente pelos movimentos fascistas da primeira metade do século XX. A Juventude Hitlerista, con-jugando fervor racista e truculência hormonal, teve papel importante na ascensão do nazismo. "Os filhos dos meus adversários me pertencem", disse Adolf Hitler, em uma de suas longas perorações ao povo alemão. O contraponto aos nazistas mirins eram os swing kids,garotos alemães que adoravam música americana e arriscavam-se a ouvir jazz e programas da rádio inglesa BBC, o que era proibido pelo regime nazista. Minoritários na Alemanha, os fãs do swing eram multidão nos Estados Unidos, onde o gênero musical começou a romper, já nos anos 30, as barreiras da segregação racial. Jovens brancos rendiam-se a um ritmo negro (ainda que interpretado por band leaders brancos, como Tommy Dorsey e Glenn Miller). E em alguns bailes até se viam brancos e negros dançando juntos.

O sucesso do swing foi decisivo para que a indústria do entretenimento despertasse de vez para o potencial da juventude como público consumidor. Nos anos 40, são lançadas as primeiras revistas dedicadas exclusivamente ao leitor jovem. Na mesma época, consagra-se a palavra teenager para definir o período que vai dos 13 ou 14 até os 19 anos. O vocábulo faz sua primeira aparição na imprensa em uma espécie de manifesto publicado em 1945 pelo New York Times - uma "Carta dos Direitos dos Adolescentes". Depois viriam os beats, os hippies, os punks, os metaleiros - mas isso já extrapola os limites do livro, que se encerra em 1945, com as bombas atômicas sobre o Japão e o som de Frank Sinatra. O final de A Criação da Juventude peca pela reprovação moralista ao "consumismo" da cultura jovem - pendor que Savage confirmou na entrevista: "A rebeldia adolescente foi banalizada pela indústria", disse. Esse purismo mal-humorado ganha mais graça quando se volta contra os quarentões que ganham a vida fazendo pose de adolescente. Savage tem ódio visceral pela obra de Nick Hornby, o escritor pop de Alta Fidelidade. "É um autor mediano, que inventou um personagem que existe apenas na sua imaginação - o tiozinho que vive como se fosse um adolescente", ataca

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