Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 31, 2009

Aula magna de Heráclio Salles Villas-Bôas Corrêa

JORNAL DO BRASIL

Revendo, a pedido da família, artigos do meu fraterno e saudoso amigo, o baiano de Santo Amaro da Purificação, Heráclio Assis de Salles, que devem compor o livro que está sendo montado com a dedicação dos seus filhos, mergulhei no texto impecável de um dos maiores repórteres e escritores da minha geração.

No artigo, com o título que aguça a curiosidade do leitor – História, dia a dia – de 11 de fevereiro de 1993, o autor esclarece que o tema gira sobre "a verificação de que, nos últimos 30 anos, a imprensa em geral, e não alguns profissionais isolados, perdeu competência para lidar com os fatos produzidos na esfera do Legislativo e também do Judiciário".

E entra firme no tema: "A verdade maior, entretanto, está em que a imprensa reflete as condições gerais de vida de uma sociedade de modo a se deixar, ela mesma, afetar pelas distorções e erros de toda a espécie. Do ponto de vista do que estamos tratando, que é a propriedade dos meios de expressão usados na transposição de fatos e temas institucionais, pode-se dizer em síntese: se a imprensa parece mal, deve-se antes buscar a causa que opera fora dos seus quadros".

E chegamos ao ponto que deve interessar especialmente aos repórteres políticos: "Em relação ao Congresso, por exemplo, a imprensa tratou sempre os temas a ele pertinente com propriedade irrepreensível, até a mudança para Brasília. Poucos foram os profissionais qualificados (pela frequentação ao plenário e às comissões) que se transferiram para o Planalto goiano. Além disso, lá, o Congresso passou, como instrumento de operação, a enfrentar condições adversas de funcionamento. E logo cairia no alvo das desconfianças e golpes de grupos autoritários, provocados pelo desequilíbrio pessoal de dois presidentes sucessivos, que acabaram abrindo o caminho às intervenções militares mutiladoras do quadro institucional.

Diante de um Legislativo que deixava de ser sujeito, para figurar como simples objeto no pensamento dominante, os jornais perderam a preocupação com os profissionais que iriam visitá-lo – e não mais freqüentá-lo – sem a qualificação exigida para a tarefa em outros tempos. Os erros se sucederam no noticiário e na avaliação crítica da importância do processo legislativo, esquecido em meio ao eclipse da vida política.

O aparelho refletidor passa a atuar, no caso, inevitavelmente, como gerador de luz falsa para iluminar uma imagem que já se construía com o propósito inconsciente de fazê-la repulsiva. Tanto é este o fenômeno que o mesmo se deu com o Judiciário, igualmente empurrado para a sombra dos regimes castrenses. Se os repórteres desconhecem o processo legislativo, igualmente não se informam, sequer sobre as espécies de processo que correm nas varas e tribunais. Pouquíssimos assimilaram a terminologia essencial, informando mal o leitor e confundindo o trabalho dos magistrados.

Tanto a causa do fenômeno era a indicada que a imprensa procurou rapidamente se aparelhar em Brasília – por iniciativa dos próprios repórteres, o que é expressivo – para tratar adequadamente os atos praticados na área econômica, também afetada pelas deficiências estruturais e de instalação física da nova capital".

Paro aqui a transcrição para algumas observações que considero pertinentes. O artigo de mestre é de fevereiro de 1993, lá se vão quase 16 anos. Do governo de Itamar Franco até os dois mandatos de Lula, passamos pelos oito anos dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso.

Não quero cometer injustiça com colegas que fazem o que podem para cobrir um Congresso que não se dá ao respeito, que não tem rotina de trabalho na madraçaria da semana de três dias úteis e que perdeu os limites da compostura com a desfaçatez com que se premiam com a cascata de vantagens, benefícios, privilégios, dezenas de assessores até a inqualificável verba indenizatória de R$ 15 mil mensais para ressarcir as despesas de suas excelências no fim de semana na base doméstica com passagens aéreas pagas pela Viúva.

A saudade do velho amigo não precisa ser invocada na pequena homenagem da transcrição de trechos de artigo que parece escrito ontem, neste espaço que ele ocupou durante anos.

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