Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, novembro 21, 2008

Terra em transe Miriam Leitão

Ninguém está bem. A crise americana se espalhou como um rastilho de pólvora e afeta cada país de forma diferente, mesmo quem parece não estar no olho do furacão. Na Espanha, o desemprego está indo para 17%; Austrália e Nova Zelândia são afetadas pela queda das commodities; o México está com déficit comercial de US$ 8,3 bi; a Bulgária terá que mudar o câmbio, a Turquia voltou ao FMI.

Dos nossos vizinhos, a pior situação é a da Argentina. O país não aproveitou o bom momento das commodities em alta e tomou decisões erradas, como a de elevar os impostos de exportação no ano passado. A produção de trigo caiu de 16 milhões de toneladas para 11 milhões, a de soja também caiu. Isso no tempo do preço bom. Um grande produtor fez com um diplomata brasileiro um comentário definitivo: — Qualquer país pode transformar crise em oportunidade, mas só a Argentina transforma oportunidade em crise.

Eles perderam o melhor momento e, desde que estatizaram a previdência privada, o medo de um novo corralito (confisco do dinheiro aplicado nos bancos) voltou a arrepiar os argentinos. Os índices de inflação continuam manipulados.

A inflação foi de 8,7% até outubro, mas o JP Morgan calculou uma inflação entre 19% e 22%. O índice de confiança do consumidor do JP Morgan está nos níveis da crise de 2002.

A Espanha é afetada pela queda do turismo e pelos problemas dos vizinhos. A economia já teve retração de 0,2% no PIB do terceiro trimestre, mas o mais assustador é o crescimento do desemprego. O déficit público deve atingir 4% do PIB em 2009.

A Bulgária e outros países bálticos têm ainda o regime de câmbio fixo em relação ao euro. Agora, terão que desvalorizar o que pode trazer mais distúrbios. A Turquia voltou ao FMI, desta vez está pedindo de US$ 20 bilhões a US$ 40 bilhões. O Banco Central turco parece confuso. Ele reduziu os juros para 16,25% logo depois de ter elevado. A inflação está em 7,5%, bem acima da meta de 4%. O sistema bancário turco é concentrado, como no Brasil, e não tem exposição direta ao risco cambial, mas seus clientes, sim. O cálculo é que as empresas têm dívidas em dólar de US$ 80 bilhões e a lira está caindo.

O México depende demais dos Estados Unidos e, por isso, sua economia cresceu 2,4% este ano. Em 2009, a previsão oficial é de 1,8%.

Pode ser bem pior. O déficit comercial aumentou e só na indústria têxtil já foram perdidos 29 mil empregos.

A Austrália é grande produtora e exportadora de commodities agrícolas e de minério de ferro. Tem uma estrutura de exportação parecida com a nossa e, não por acaso, também está com queda forte do valor da sua moeda frente ao dólar, pela perspectiva de perda de receita de exportação. O governo australiano planeja lançar um plano para liberar crédito para a venda de veículos depois que a GMAC e a GE Money saíram do país. Lá foi lançado um pacote fiscal, para incentivar o consumo, de US$ 10 bilhões. Isso já elevou a confiança do consumidor neste mês, que tinha caído 11% em outubro.

O que o governo australiano está fazendo é incentivar o consumo e o endividamento das pessoas, para compensar a perda de demanda externa. O pacote da China pode ajudar a Austrália, já que mais da metade do minério do país é exportado para os chineses, mas a Rio Tinto já anunciou que vai cortar 10% de sua produção.

Na Austrália, a bolsa já caiu 43% este ano, o dólar já subiu 33% desde o início de agosto e o governo reviu para baixo o crescimento do PIB no ano fiscal que termina em junho do próximo ano: 1,5%. A previsão de alta no PIB para o mesmo período, feita em agosto, era de 2,25%. Por esse motivo, a confiança dos empresários australianos está caindo.

A China começa a ter problemas de desemprego. O dado oficial é de 4%, parece pouco, mas o número é muito maior. Eles não põem na conta os trabalhadores “imigrantes”, ou seja, que vieram do interior para a área urbana. E eles são 200 milhões.

O Equador, que está atrasando o pagamento da dívida externa, teve em setembro seu primeiro déficit na balança comercial mensal em um ano e meio e o saldo está caindo por causa da queda do preço do petróleo.

Todo país tem algum desequilíbrio que está sendo agravado pela crise.

— É um quadro aterrador.

Não dá para dizer que estamos numa depressão, mas é certo e líquido que o mundo está numa recessão com risco de deflação nas principais economias mundiais, o que pode gerar um ciclo vicioso de queda dos preços e do consumo — afirma o economista Fábio Silveira, da RC Consultores.

Para Silveira, os países emergentes, entre eles o Brasil, vão sentir mais fortemente os efeitos desta crise no segundo semestre do ano que vem.

— Tivemos uma primeira rodada de recessão em alguns países. Isso vai desacelerar o crescimento dos países emergentes, principalmente os que são exportadores de commodities.

No Brasil, o segundo semestre do ano que vem deve ser o pior desde o segundo semestre de 2003.

Tem economista que acha que o primeiro trimestre já vai ser difícil. Seja como for, o milagre da multiplicação da receita tributária, que o país fez nos últimos anos, não vai se repetir. E o governo aumentou as despesas do ano que vem.

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