Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 30, 2008

Diogo Mainardi O Eddie Murphy político


"Barack Obama é o que os outros desejam que ele seja. Dependendo da platéia, pode metamorfosear-se em branco, como o herói de nossa gente, Macunaíma"

John McCain tem o cabo eleitoral perfeito: Vladimir Putin. O cálculo é simples: cada metro quadrado que a Rússia arranca da Geórgia equivale a um eleitor amedrontado a mais que John McCain arrebanha nos Estados Unidos. Se é para guerrear, é melhor ter um presidente guerreiro. Vladimir Putin fez uma campanha porta a porta, derrubando as portas dos georgianos com seus tanques e, candidamente, cabalando votos para John McCain.

Algumas semanas atrás, Barack Obama reuniu mais de 200 000 pessoas em outra porta, a de Brandemburgo, em Berlim. John McCain, que imediatamente saiu em defesa dos georgianos, talvez conseguisse reunir uns 2 000 refugiados no pátio de uma fábrica de fertilizantes em Tbilisi. Foi pensando nisso que ele realizou o sonho secreto de todos os homens casados do planeta e despachou sua mulher, Cindy, para a zona de guerra. O melhor conselho que Cindy McCain teria a dar ao presidente georgiano, Mikhail Saakashvili, seria renunciar às camisas lilases.

Se John McCain pode contar com um cabo eleitoral do peso de Vladimir Putin, Barack Obama tem de refrear o apoio de celebridades como Bruce Springsteen, Bon Jovi e Ben Affleck. A campanha de John McCain avacalhou Barack Obama, rotulando-o como uma estrela deslumbrada com o próprio sucesso. A imagem colou porque ele sempre soou pomposo demais, cabotino demais, ensaiado demais. Até para reclamar do aumento da gasolina ele usa o método Stanislavski.

O fato é que ninguém sabe quem é Barack Obama. Nem ele sabe. Ele é o que os outros desejam que ele seja. Sim, Barack Obama é o primeiro candidato negro da história dos Estados Unidos. Mas, dependendo da platéia, ele pode metamorfosear-se em branco, como o herói de nossa gente, Macunaíma. Barack Obama é meio Grande Otelo, meio Paulo José. Ele se apresenta de um jeito na selva e do jeito oposto na casa de Venceslau Pietro Pietra. Barack Obama, mais do que eleitores, tem devotos. Barack Obama simboliza o novo. Mas, em queda nas pesquisas eleitorais, ele aceita a tutela de um velho e escolhe Joe Biden para ser companheiro de chapa. Um velho cujo único atributo, além de ter superado uma gagueira sessenta anos atrás, é a reconfortante velhice de suas idéias.

Barack Obama foi trombeteado como um candidato capaz de superar as barreiras ideológicas, sociais e raciais dos Estados Unidos e – ajoelhai-vos! – do mundo. Para tentar sustentar essa impostura, ele passou a interpretar uma multiplicidade de papéis, trocando de fantasia a toda hora, como Eddie Murphy naquelas suas comédias rasteiras, que deram o tom a este artigo. Agora isso mudou. A unicidade de Barack Obama, cada vez mais, parece esconder somente uma constrangedora vacuidade. Quanto mais etéreo ele é, mais prático e terreno se torna John McCain. Aos 72 anos, basta ele fazer de conta que ainda está vivo, lembrando-se de respirar a cada 35 minutos. É por isso que ele poderá ser eleito: ocasionalmente, ele respira.

 


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