Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 31, 2008

Celso Ming O que é. E o que não é

As explicações que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deu ontem deixaram o projeto do Fundo Soberano do Brasil menos confuso. As dúvidas sobre pontos fundamentais ainda são grandes. Mais do que isso, pode ser uma caixa de fósforos em mão de criança. Mas este é um risco que talvez possa ser evitado.

Ficaram claros três pontos: (1) a prioridade do momento é ajudar o Banco Central a combater a inflação e não mais financiar projetos de desenvolvimento em países vizinhos ou a expansão de empresas brasileiras no exterior - como havia sido anunciado; (2) o Fundo tem por objetivo reforçar o superávit primário (sobra de arrecadação sem aumento das despesas do governo); e (3) por enquanto, esses recursos não serão aplicados em dólares.

Na prática, o superávit primário fica elevado de 3,8% para 4,3% do PIB (ou de cerca de R$ 99 bilhões para R$ 112 bilhões). A manobra política por trás da decisão é retirar recursos que estão sob ameaça de ser desviados para novas despesas correntes do setor público e, a partir daí, alimentar o consumo interno, fator que está aumentando as labaredas da inflação.

Isto posto, dois questionamentos. O primeiro é o de que, sem compromisso de fato, não há como garantir o efeito pretendido. O governo não pode comprometer-se com o aumento do superávit enquanto o projeto do Fundo não for aprovado pelo Congresso. Enfim, o ministro promete entregar o que não depende só dele. E o Copom não pode deixar de puxar os juros apenas porque o ministro avisou que não vai deixar o Banco Central sozinho.

Os políticos têm outras prioridades para o emprego do excesso de arrecadação e podem rejeitar a idéia. No momento, querem porque querem mais dinheiro "para a Saúde", pouco se importando como isso será gasto e pouco fazendo para evitar novos escândalos, como o das ambulâncias.

Melhor e mais adequado seria usar imediatamente os recursos na redução da dívida pública. É o que aumentaria a capacidade de endividamento que, por sua vez, possibilitaria o levantamento de recursos até para capitalizar o Fundo.

A redução da dívida seria, também, a forma mais eficiente de usar esse dinheiro como instrumento destinado a enfrentar tempos de vacas magras (poupança contracíclica), como defende o ministro. Em outras palavras, o governo não precisa desse Fundo nem para ajudar o Banco Central a conter a inflação nem para dar vida ao cofrinho do ministro Mantega.

No momento, o governo está embrulhando o projeto com embalagem destinada a neutralizar duas pressões: a das formigas, que defendem aumento do superávit primário e contenção severa da inflação; e a das cigarras, que defendem despejo imediato de dinheiro na gastança.

A outra dúvida é sobre o que os políticos ou, se não eles, os tecnocratas deste governo ou dos seguintes farão com esse Fundo mais à frente, quando as reservas estiverem faiscando.

Para concluir, se a opção é criar o Fundo ou abater a dívida pública, o melhor é, de longe, abater a dívida. Mas, se a opção é criar o Fundo ou deixar a porta escancarada para a gastança, então o melhor é criar o Fundo.

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