Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, dezembro 31, 2007

Desenvolvimento econômico sustentável

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Folha de S.Paulo



É um equívoco colocar em conflito dois objetivos fundamentais, que podem ser combinados

OS RESULTADOS da conferência de Bali sobre o aquecimento global deixaram a desejar. O que se discutia era o futuro da humanidade e o que se viu foi uma luta mesquinha entre os países para saber como dividir os custos de um problema que é de todos nós enquanto participantes da sociedade global. Os países mais resistentes a um acordo eram os Estados Unidos, a China e a Índia. O primeiro sem nada poder alegar em seu benefício, os dois últimos exigindo para o novo acordo a mesma idéia que o Brasil tornou vitoriosa no Protocolo de Kyoto -a idéia, que precisa ser revista, que os danos históricos feitos pelos países ricos no ambiente justificam que os países em desenvolvimento não sejam obrigados a contribuir para a diminuição da emissão de carbono.
Conforme relatou "The Economist", quem salvou a conferência foi um representante da Papua-Nova Guiné, condenada a submergir pelas águas se os grandes países não agirem, que, indignado com a resistência dos Estados Unidos em colaborar, aproximou-se do microfone e bradou emocionado, "se por alguma razão vocês não estão querendo liderar, deixem o problema para nós, por favor, apenas não atrapalhem".
O aplauso foi enorme. Alguns minutos depois, vencida, a representante americana: "nós iremos adiante e participaremos do consenso". Este, entretanto, foi modesto. O principal resultado, em parte graças à proposta do Brasil de se criar um fundo internacional para proteger a floresta amazônica, resumiu-se a um projeto sobre como interromper o desmatamento global. No mais, como a própria "Economist" reconhece, o que se produziu foi "uma declaração de boas intenções, da qual os Estados Unidos lograram que todo conteúdo substantivo fosse eliminado" (texto completo em meu site).
Por trás dessa resistência existe o pressuposto de que o crescimento econômico -com o qual todos os governos estão comprometidos- não é compatível com o desenvolvimento sustentável ou, em outras palavras, que os custos do combate ao aquecimento global são muito altos.
Desde que, há 15 anos, orientei uma tese de doutoramento sobre o controle da poluição na cidade de São Paulo, estou convencido de que esse pressuposto é equivocado: esses custos são menores do que geralmente se pensa. Os custos serão elevados em duas condições: se quisermos eliminar todos os efeitos negativos da poluição e se estabelecermos objetivos de curto prazo. No primeiro caso, porque os custos de eliminá-la crescem inicialmente pouco, mas se tornam muito altos quando nos aproximamos de níveis elevados de neutralização da poluição. No segundo, porque as mudanças nas empresas, nos veículos e no desmatamento só podem ser realizadas de forma econômica se forem graduais -no caso dos automóveis, por exemplo, definindo regras duras para os novos veículos, como está fazendo a União Européia.
Portanto, desde que todos concordem com essas duas condições, não há razão para tanta resistência a um acordo global sobre o efeito estufa. O desenvolvimento econômico é necessário, mas deve e pode ser também sustentável. É um equívoco colocar em conflito dois objetivos fundamentais, que, se forem buscados de forma razoável e inteligente, podem ser combinados.

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