Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 22, 2007

Diário de bordo Miriam Leitão

Metálicos. Acho que estávamos todos metálicos no aeroporto do Galeão. Eu apitei e não era o relógio, nem os óculos. Entrei e saí do detector de metais e continuei apitando. Outra passageira, atrás de mim, apitou mais. A fila para passar no raios X ia até a metade do saguão. Tão grande que um homem comentou comigo: “Eu vi uma fila e fui entrando nela, mas nem sei se é mesmo a do raios X.” O passageiro nunca sabe em qual dos vários pontos de estrangulamento ficará retido.

Vê uma fila e já vai logo parando. Alguns ficam mais nervosos; a maioria tolera os vários infortúnios: a Polícia Federal, de quando em vez, faz corpo mole e aí se formam filas imensas. Se é o controlador aéreo que faz corpo mole, piora: os aviões ficam no chão. Não chamo de operação padrão, porque isso significaria que, nos dias normais, está tudo fora do padrão.

Corpo mole é a expressão mais correta.

Estou escrevendo enquanto espero. A companhia aérea acaba de informar que meu vôo, já atrasado, tem previsão de decolar daqui a uma hora. Calculo que, com sorte, o atraso será de duas horas. Já prevendo isso, havia dado 4,5 horas de distância entre o momento em que chegaria ao destino e o compromisso. Tenho sorte de ter encontrado um lugarzinho para sentar. Em volta, as pessoas vão avisando: — Eu ligo para confirmar o embarque; você tem notebook aí? Deixa tudo preparado porque chegarei atrasado à reunião — avisa um rapaz.

Celulares, notebooks, pendrives, wi-fis vão salvando um pouco da produtividade perdida neste gargalo sem fim que virou a crise aérea. No carro, vim ouvindo Artur Xexéo reclamando na CBN: — O que aconteceu com as promessas de que tudo seria resolvido após a última greve dos controladores? É isto. O governo age apenas nas horas de colapso agudo.

Depois relaxa. O presidente Lula pediu “prazo, dia e hora” para a crise acabar. Isso foi no ano passado. O presidente da Anac disse que a situação estava sendo resolvida paulatinamente. Isso foi antes do Natal de 2006.

Só se fala desse assunto.

Renato Machado reclamou no intervalo do “Bom Dia Brasil”: — Quando houve o apagão energético, o governo montou um gabinete de crise, chamou o Pedro Parente e, em pouco tempo, havia um plano para enfrentar a crise. Agora não há ainda um gabinete de crise funcionando, não se sabe quando isso vai acabar.

Foi o mesmo paralelo feito pelo motorista que me levou ao aeroporto.

Num dos dois vôos em que voei na quarta-feira, cheguei bem mais cedo ao aeroporto.

Meu vôo era às 16h40m. Cheguei a tempo de folga para pegar o das 16h10m. Mas o rapaz da TAM me disse: — Tem lugar no avião, mas não há disponibilidade para a senhora, a menos que vá até o balcão no saguão e pague, porque sua tarifa, pelo horário, era mais baixa.

Não aceitei, tive que ficar esperando meu vôo, e o lugar que ocuparia foi vazio.

Ontem tentei, de novo, antecipar um vôo. A fila é um exemplo da ineficiência da TAM. Os atendentes conversam; uma, ao acabar o atendimento, olha o que os colegas estão fazendo, dá palpites superficiais, volta, entra, exibe calma. Só não olha para a fila que cresce. Quando sou atendida, o rapaz demora 15 minutos para descobrir que posso, sim, trocar o vôo, desde que pague a tal tarifa. Concluí: o vôo mais caro é sempre aquele para o qual quero ir.

Não há transparência alguma sobre os critérios que formam os preços das tarifas do incompetente e abusivo duopólio que controla este mercado. Fico calculando o custo dos novos oito boeings da TAM e o volume pequeno de recursos que seria necessário investir para evitar esses gargalos nos seus balcões.

Logística do atendimento, uma avaliação de custo/ benefício de algumas práticas, melhoria do relacionamento com o cliente aumentariam a produtividade.

As empresas se preparam para crescer, fazem grandes investimentos, compram aviões, modernizam frotas, captam no exterior, abrem capital. A preocupação da regulação é apenas que o capital estrangeiro não passe de 20% da companhia. E só.

Com mais empresas no mercado, inevitavelmente, haverá competição com a dupla TAM-Gol, e elas terão que ser eficientes e tratar melhor o consumidor. É lei de mercado. Mas, com o governo, a gente faz o quê? Ele bloqueia o caminho, como pedra, como nó cego, como doença crônica. Deveria já ter, a esta altura, nove meses depois de iniciada de forma tão trágica a crise aérea, alguma resposta. É necessário mais investimento no controle aéreo: mais pessoal, mais qualificação, mais equipamentos, mais fiscalização.

Adianta pouco prender controlador. Os militares deveriam saber que, se prender gente resolvesse alguma coisa, eles estariam até hoje no poder. Precisamos de inteligência e estratégia. Agência reguladora não pode ser cabide de emprego para indicações políticas. A Infraero tem que ser mais competente na gestão dos aeroportos e no planejamento da infra-estrutura. Do contrário o país não decola.

A propósito: meu vôo da manhã, quando comecei esta coluna, atrasou duas horas.

Agora espero o vôo da volta; já está quatro horas atrasado.

Vivo uma situação kafkiana. A Infraero nos manda buscar informação com as companhias, as companhias estão fora da sala de embarque, não podemos sair. Espero que, quando vocês estiverem lendo esta coluna, eu já tenha conseguido chegar em casa

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