Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 30, 2007

Ambição nuclear Miriam Leitão

O ministro Sergio Rezende, da Ciência e Tecnologia, um dos maiores entusiastas e defensores da decisão de retomar Angra 3, disse-me ontem que a decisão foi “o ponto de partida para que o Brasil tenha um programa nuclear para valer”. Uma das opções do lixo atômico é fazer uma licitação entre os municípios brasileiros para saber quem quer recebê-los em troca de uma transferência de recursos. “É assim em outros países”, comenta o ministro.

— O grande medo neste momento no Brasil é de faltar energia, e a nuclear tem várias vantagens. Uma delas é que, desta forma, diversifica-se a matriz energética.

Outra vantagem é que ela não tem sazonalidade.

A energia hidrelétrica tem um sazonalidade terrível. A terceira é que pode ser instalada perto dos centros consumidores; a única exigência é que haja água para refrigerar a usina.

As hidrelétricas da Amazônia, por exemplo, têm que ser feitas, mas terão uma grande perda de energia na transmissão para os centros de consumo — afirma Rezende.

Assim, diz que a nossa matriz atual é tão sujeita à sazonalidade que a composição com energia nuclear é ideal, porque, na nuclear, segundo ele, há apenas paradas técnicas para manutenção ou para troca de pastilhas no núcleo do reator.

— São pastilhas que duram seis meses, e são três em cada reator. Desta forma, pode-se parar por apenas algumas horas, trocar uma das pastilhas, e logo depois ela está pronta para voltar a funcionar — explica.

Outra das vantagens da energia nuclear, na opinião do ministro da Ciência e Tecnologia, é que o Brasil tem matéria-prima abundante: — Nossas reservas de urânio conhecidas são suficientes para alimentar Angras 1, 2 e 3 por 500 anos.

A grande questão levantada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é que a humanidade ainda não sabe o que fazer com os rejeitos. A pastilha usada é tirada da usina, mas continua irradiando por milhares de anos. Hoje, elas são colocadas numa piscina, porém, quando a piscina não comportar mais, terão que ser postas em tanques blindados e enterrados no que o ministro chama de “depósito semidefinitivo”.

Mas onde enterrar ? — Uma das idéias é fazer uma licitação para saber que município brasileiro aceita que o lixo seja enterrado em seu território por 300 anos e, neste período, o município receberá uma receita para tanto.

Não vai faltar município. É assim em outros países.

Sergio Rezende está convencido de que o controle da tecnologia também não será um obstáculo: — Hoje controlamos grande parte da tecnologia de construção da usina, menos a do núcleo do reator, e apenas uma parte do ciclo de enriquecimento do urânio tem que ser feita fora do país. Num programa maior, não tenho dúvida que desenvolveremos tecnologia para controle de todo o processo.

E os riscos de vazamento? O ministro também acredita que não é problema.

Lembra que houve dois casos de vazamento: Chernobyl e Three Mile Island. O primeiro foi catastrófico, mas era uma usina de tecnologia ultrapassada, um reator de primeira geração; e o segundo não teve vítimas.

A energia nuclear sempre será polêmica por vários motivos e aqui estão os argumentos de um apaixonado defensor da opção nuclear.

O ministro me ligou porque, segundo ele, queria responder a alguns argumentos publicados aqui contra a energia nuclear.

O especialista em energia, David Zylbersztajn, envioume um e-mail argumentando que as restrições ao projeto de Angra 3 fazem sentido. O primeiro ponto dele é como alguns projetos viram, de repente, a salvação da vez. Agora, Angra; antes, Madeira. Mas o que particularmente preocupa Zylbersztajn é o custo da usina.

— No final dos anos 80, fiz uma análise de custos de Angra 1, publicada na revista da SBPC, e demonstrei que havia enormes “equívocos” de contabilidade que levavam o preço da energia da usina à estratosfera.

É típico na história do setor elétrico brasileiro a subavaliação dos orçamentos iniciais e a farra de aditivos contratuais ao longo da obra — lembra.

No caso de Angra 3, Zylbersztajn diz que há muitas dúvidas sobre o valor de R$ 7,5 bilhões para o resto da obra, que já consumiu R$ 2,5 bilhões.

— Alguém auditou os números apresentados? Qual o custo de oportunidade desses R$ 10 bilhões? Quanto de pesquisa com fontes renováveis poderia ser feito com tanto dinheiro? Segundo ele, a usina será subsidiada, já que dificilmente se conseguirá uma tarifa que cubra os custos.

— E subsídio por subsídio, por que não para eólica, solar ou biomassa? O ministro Sergio Rezende garante que não haverá subsídio: — Hoje não há subsídio em Angras 1 e 2, e a Eletronuclear dá lucro. A Eletrobrás é que fará a usina, porque isso é monopólio estatal. Ela tomará empréstimo no BNDES, a tarifa terá que ser realista, e terá que cobrir os custos do financiamento.

Os dados mostram que é uma energia mais barata que diesel e car vão.

O ministro diz que um ambientalista tem que ver o lado bom da energia nuclear neste momento: — Ela não emite nada de CO2.

Essa energia está condenada à controvérsia apaixonada.

Mas uma coisa é certa: o governo precisa explicar melhor como será este “programa nuclear para valer” de que fala o ministro da Ciência e Tecnologia.

Arquivo do blog