Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Míriam Leitão - Um susto



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
28/2/2007

O que aconteceu ontem nas bolsas do mundo todo assustou. No Brasil, a Bovespa não caía assim desde o 11 de Setembro; a bolsa chinesa teve sua pior queda em 10 anos. Os mercados foram caindo ao longo do dia como peças de dominó. Mas foi um susto. O cenário, apesar de mais volátil, continua positivo, de alta liquidez. E os fundamentos brasileiros são bons. Nos primeiros dias de 2007, os cálculos eram que, na virada do ano, o Brasil teria US$100 bilhões de reservas cambiais. O número vai ser atingido esta semana.

Os últimos anos, apesar de alguns momentos ruins, foram de otimismo nos mercados internacionais. No Brasil, de 2003 para cá, a bolsa subiu 281%. A maré de boas notícias e liquidez aumentou mais nos últimos meses e acabou provocando uma forte valorização dos ativos nas bolsas de todo o mundo; sobretudo nos mercados emergentes. Esse cenário positivo ajudou o Brasil a aumentar ainda mais suas reservas. Com o otimismo lá no alto, não foi por acaso que o dólar no país, nos últimos meses, caiu mais.

O que aconteceu ontem também não foi por acaso. O próprio mercado espera que, em épocas como esta, de excesso de otimismo, haja movimentos de realização de lucros. Desde maio do ano passado, que eles não aconteciam.

- A melhora está ocorrendo em todos os emergentes, mas é preciso tomar cuidado com o excesso de otimismo. Sempre há um período de valorização dos ativos, depois uma correção, e há momentos em que o humor muda. Quando há otimismo, como nos últimos meses, ninguém costuma ver os problemas, mas eles acabam aparecendo depois - afirmou Roberto Padovani, do WestLB.

Existe uma concordância no mercado de que os problemas nos ativos não vieram para ficar; são apenas ajustes. Mas Padovani acredita que 2007 deverá ser um período de economia bem mais volátil, diferentemente do ano passado.

- A economia mundial vai, de um modo geral, muito bem. Ao longo de fevereiro, houve uma mudança de humor para melhor; na verdade, uma certa euforia nos mercados internacionais, com muita liquidez. É um tempo de enorme exuberância nos mercados e, quando é assim, os ajustes podem acabar sendo fortes, como aconteceu nesta terça-feira. O que houve foi resultado do excesso de alavancagem - disse ele.

Mas, neste episódio, há um fator que precisa começar a ser olhado com mais atenção. Até agora, pouca gente conseguiu entender bem, com clareza, o que se passa na China. No mercado, não se tem informações muito nítidas de como funciona a economia deles, altamente controlada. A queda brusca de ontem, que pode continuar esta semana - ainda que mais fraca -, acendeu a luz amarela para aspectos ainda pouco transparentes da economia chinesa, isso sem falar nos problemas políticos.

Um artigo no "Washington Post" chamou a atenção para o fato de que o país tem muitos problemas que ainda não foram sanados, mesmo com o enorme crescimento chinês, ao redor de 10%. Mais que provável é recomendável que o mercado passe a olhar com mais desconfiança para o que se passa, de verdade, na China.

Porém, apesar de tudo isso, as expectativas para o Brasil, que hoje tem fundamentos bem melhores, são boas.

- Os fundos estrangeiros não têm questionado os fundamentos brasileiros; não têm intenção de diminuir o investimento no país - conta Nuno Câmara, do Dresdner, em Nova York.

- A volatilidade aumentou, mas não dá para descartar que haja melhoras, em breve. Os fundamentos do país são vistos como um ponto positivo - diz Alexandre Maia, da Gap Asset.

As reservas são uma boa demonstração de que o cenário é bom. Elas vão muito bem. Em fevereiro, até o fechamento da segunda-feira, o Banco Central havia comprado mais US$7 bilhões. O país está com excelentes indicadores econômicos nessa área, uma taxa de juros alta demais, e com perspectiva de queda.

- Só a expectativa de que os juros vão cair já atrai mais recursos, porque o investidor pensa assim: "tenho de entrar agora porque, senão, terei prejuízo" - comenta Padovani.

O economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados, argumenta que é preciso aproveitar melhor quando o vento estiver soprando a favor, não apenas acumulando reservas, mas fazendo outras mudanças que fortaleçam a economia. Isso protege o país caso haja risco de haver uma crise de fato. Apesar da alta do risco-país e do dólar ontem, as perspectivas continuam boas.

- O risco vai continuar caindo e o dólar se manterá baixo, o que ajuda a deixar a inflação baixa. As reservas chegarão a US$100 bilhões esta semana e vão a US$120 bilhões este ano. Isso vai ajudar a derrubar a taxa de juros mais rapidamente - afirma José Roberto Mendonça de Barros.

O que houve nesta terça-feira foi um susto. As indicações positivas na economia mundial continuam existindo, mas este ano será de mais volatilidade, com outros solavancos como este de ontem.

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