Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Tiros no pé


EDITORIAL
O Globo
22/12/2006

A decisão do presidente Lula de aceitar o acordo feito pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho, com centrais sindicais em torno de um salário mínimo de R$380 obrigou o próprio presidente a adiar o pacote que ele tanto reclama para supostamente "destravar" a economia.

O caso é emblemático das contradições do governo diante dos rumos da economia. O Ministério da Fazenda, cauteloso como deve ser, preferia um mínimo de R$367, com um aumento de 4,8% - portanto, ainda com um ganho real para o assalariado, por ficar acima da inflação anualizada de, aproximadamente, 3%.

Mas no Orçamento foi incluída a cifra de R$375, obrigando a Fazenda a refazer os cálculos dos gastos para o ano que vem, em função do impacto sobre a Previdência.

Fechados os números, Lula aceitou o acordo de Marinho e bateu o martelo nos R$380, num ato de puro populismo. Significa um reajuste de 8,5% e uma conta adicional de R$800 milhões remetida para o INSS. Novamente, Mantega, derrotado na queda-de-braço, precisou voltar à maquina de calcular.

Pelo menos, o adiamento permitirá que o governo reflita sobre a contradição que é, ao mesmo tempo em que acena com a redução de impostos para ativar setores-chave e acelerar os investimentos, tomar decisões que implicam aumento desmesurado de gastos.

Como a única maneira saudável, do ponto de vista macroeconômico, de fazer essa operação de corte de impostos é também podar as despesas, o que está em curso em Brasília é um monumental tiro no pé.

Não bastasse o acordo de Luiz Marinho incluir uma regra de indexação do salário mínimo (ao PIB e à inflação), haveria a intenção de se fazer algo semelhante com a folha do funcionalismo. Assim, engessa-se mais ainda a administração do Orçamento, já bastante atravancada.

Está claro, como confirmou o próprio ministro da Fazenda no Senado, que o governo tentará compensar a gastança reduzindo o superávit primário, por meio do Projeto Piloto de Investimento (PPI) - a dedução de investimentos públicos do superávit, tema que estava em discussão com o FMI.

Outro tiro no pé. Com isso, deixará de cair, ou cairá mais lentamente, a relação dívida/PIB, e o Banco Central provavelmente precisará ser mais parcimonioso na redução do juros. O resultado será o oposto ao desejado pelo presidente e por todos: a economia continuará travada.

Arquivo do blog