Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, dezembro 27, 2006

O etanol do Brasil assusta


Artigo - Claudia Mancini
Gazeta Mercantil
27/12/2006

Os Estados Unidos costumam me dar a impressão de que quando perdem um bonde, tomam um supersônico para recuperar o tempo perdido. É o que parece acontecer com o etanol. Há naquele país 110 usinas de produção e cerca de 70 em construção. A produção cresce cerca de 1 bilhão de galões (3,8 litros) ao ano. Por uma lei federal, até 2012 precisa atingir 7,5 bilhões de galões. Mas isso deve acontecer até 2008. Em 2012, poderá ter saltado para cerca de 11 bilhões de galões.
Washington calcula que quando o país produzir 60 bilhões de galões/ano, isso será perto de metade do uso de gasolina. Será uma vitória, disse a este jornal Brian Jennings, vice-presidente executivo da Coalizão Americana para o Etanol (ACE), "porque não acreditamos na substituição total da gasolina". Segundo ele, as empresas de petróleo afirmam que 46% da gasolina usada no país têm agora 10% de etanol. No total de galões, o percentual é pequeno sobre o consumo, mas há anos a adição era de 35% da gasolina.
O etanol virou uma espécie de laranja: Brasil, que produz na faixa de 17 bilhões de litros/ano, e EUA concentram cerca de 70% da produção global. São os donos do combustível, como do cítrico. Mas há uma diferença: o americano é feito de milho e o brasileiro, de cana-de-açúcar. Há também a enorme diferença de preço. Estima-se que na usina o americano seja 30% mais caro.
As informações que chegam dos EUA indicam um misto de temor e desejo de parceria com o Brasil. Jennings confirma: no que se refere ao mercado doméstico, há temor da ACE, que reúne mais de 1,2 mil membros - usinas, plantadores, investidores e fornecedores de equipamentos. "Não queremos ser dependentes do petróleo da Venezuela. Embora o Brasil seja um forte amigo e aliado, também não queremos ser dependentes do etanol brasileiro", diz ele, no que pode ser a afirmação de executivo e opinião de cidadão.
Hoje, parte do etanol consumido lá sai daqui, direto ou via Caribe, que exporta com redução tarifária. Com a corrida interna de produção nos EUA, a Unica, associação de usinas de cana daqui, estima que o volume de exportação pode cair em 2007. Para garantir que o etanol brasileiro não atrapalhe, semana retrasada o Congresso manteve por dois anos a sobretaxa de 54 cents sobre o galão do Brasil, que já paga imposto de 2,5%.
E o lado da parceria? Jennings diz esperar que isso seja possível. Mas não sabe dizer quando, como e nem em que seria.
Ele não sabe, mas há quem saiba. O governador da Flórida, Jeb Bush, irmão do presidente George W. Bush - aquele que disse que os americanos são viciados em petróleo -, assinou um convênio com Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, e o BID para criação da Comissão Interamericana do Etanol, para incentivar o uso do produto. Há quem acredite que isso possa derrubar barreiras tarifárias lá. Talvez. Mas outra boa possibilidade é de que pode tornar o produto uma commodity global, como interessa ao Brasil, e incentivar a compra aqui de projetos de usinas, uma dos poucas áreas em que podemos fornecer tecnologia.

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