Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 29, 2006

Dora Kramer - Corrida de fundo




O Estado de S. Paulo
29/11/2006

Quanto mais o PT fala na possibilidade de abrir mão da presidência da Câmara, mais firme parece ser o projeto do partido de eleger o presidente da Câmara. O que os petistas não querem agora é repetir o açodamento e a prepotência que por duas vezes - na eleição e depois na sucessão de Severino Cavalcanti - tiraram deles a chance de reassumir o posto conquistado em 2003 e que esperavam manter por todo o período de Luiz Inácio da Silva na Presidência da República.

O projeto, o partido já chegou à conclusão, não requer força nem estridência, mas jeito e muita malemolência. O próprio líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia, candidato assumido à presidência, deu uma freada na campanha e tem sido mais discreto depois que recebeu um recado do Planalto de que deveria ir mais devagar com a louça ou, então, deixar a liderança para se dedicar só à campanha.

Outros postulantes, estes não assumidos, como Walter Pinheiro e José Eduardo Cardozo, também se mantêm algo recolhidos, trabalhando na construção da unidade da bancada - a idéia é apresentar só um candidato - e da quebra de resistências na oposição, principalmente no PFL.

A imagem usada internamente é que se trata de uma corrida de fundo, ao molde das maratonas, e não das disputas rápidas de 100 metros. Observam com cuidado os movimentos do presidente Lula, para eles ainda um tanto obscuros, mas já suficientes para lhes dar a percepção de que, em ambiente de confusão e divisão, Lula baterá mesmo o martelo em favor da reeleição de Aldo Rebelo.

A despeito das aparências, a reeleição de Rebelo não seria o cenário mais desejável, embora seja o mais confortável para o governo neste momento de intensas e tensas disputas por espaço na montagem do jogo para o segundo mandato.

Há obstáculos sérios a serem enfrentados. O primeiro, a condição legal do atual presidente para se apresentar a um novo período. No dia 7 de dezembro o Supremo Tribunal Federal vai julgar uma ação de inconstitucionalidade da cláusula de desempenho eleitoral e, se decidir pela legalidade da norma, Rebelo não teria como exercer funções legislativas, pois seu partido, o PC do B, não atingiu nacionalmente a votação mínima exigida.

O segundo, a determinação do PT, hoje bastante disfarçada por uma estudada prudência, e a ambição do PMDB. Este tem quase assegurada a reeleição de Renan Calheiros na presidência do Senado e não vai pôr isso em risco por causa de um posto para o qual só pode eleger uma pessoa quando, abrindo caminho para o PT, pode obter ministérios onde abriga muito mais gente.

Se a Justiça barrar a reeleição de Aldo Rebelo, as coisas se precipitam. Se não, o banho-maria será mantido até a virada de 2007, para quando, então, está previsto o movimento decisivo de agradecimentos a ele pelos grandes serviços prestados à causa num momento difícil e o anúncio de que chegou a hora de o PT reconquistar, com o aval de Lula, o lugar de onde considera nunca deveria ter saído.

Brasil varonil

A oposição tem se empenhado fortemente para confirmar as acusações que lhe eram feitas pelos governistas, segundo as quais seu furor moral guardava relação com a campanha eleitoral e nada mais.

De dossiê Vedoin, PSDB e PFL não podem mais falar, dado o corpo mole de ambos os partidos na CPI dos Sanguessugas, em franca adesão a uma operação compasso de espera para o fim oficial dos trabalhos.

De máfia das ambulâncias tampouco podem tratar com desenvoltura. Ontem, mansíssimos na reunião do Conselho de Ética do Senado, tucanos e pefelistas - com a única exceção do senador Demóstenes Torres - deixaram de lado o consistente relatório do senador Jefferson Peres, apontando quebra de decoro do senador Ney Suassuna, e aprovaram o voto em separado do senador Wellington Salgado, pedindo uma censura verbal.

Tão serelepe estava a oposição que o senador Heráclito Fortes chegou atrasado, mas deu seu voto 'sim' à censura verbal sem saber o que se passava, por indicação risonha dos companheiros de plenário. Todos acharam muito engraçado o gesto.

De impugnação dos mandatos de deputados eleitos e sobre os quais pesam provas de envolvimento em abuso de poder econômico, corrupção ou fraude - assunto muito ventilado durante a campanha - também não se ouve mais falar.

Nenhuma palavra, nem mesmo sobre o caso do deputado eleito Juvenil Alves, preso pela Polícia Federal sob a acusação, sustentada pelo Ministério Público, de chefiar uma organização criminosa especializada em crimes financeiros. A quadrilha, segundo a PF e os procuradores, deu prejuízo de R$ 1 bilhão ao erário.

O artigo 14 da Constituição reza que os mandatos podem ser impugnados até 15 dias a contar da data da diplomação (ainda não ocorrida), mediante ação junto à Justiça Eleitoral.

Do jeito que a coisa vai, restará comprovada a limitação do ímpeto ético a períodos pré-eleitorais e a situações que envolvam exclusivamente gente do PT ou do baixo clero governista.

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