Entrevista:O Estado inteligente

domingo, julho 30, 2006

JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN O financiamento da universidade pública

FOLHA


O diplomado de uma faculdade pública poderia pagar depois de formado parte do custo da sua educação

O NÚMERO de universitários no Brasil tem aumentado rapidamente, o que é uma boa notícia. O setor privado tem sido responsável por grande parte dessa expansão, e hoje mais de 70% dos alunos de curso superior estudam em escolas particulares, um índice semelhante ao do Chile e ainda inferior ao da Coréia ou do Japão, mas entre os mais altos do mundo.
Apesar de terem uma participação decrescente no ensino superior, as universidades públicas ainda têm um papel importante. Algumas das melhores universidades no Brasil são públicas, e os estabelecimentos federais e estaduais têm um papel dominante na condução da pesquisa no país. Em todo o mundo, os governos subsidiam a educação universitária, e o Brasil não deve ser uma exceção.
O problema no nosso país é o nível de subsídio existente e quem são os beneficiados. O país gasta com cada aluno do curso superior 11 vezes o que gasta com um aluno do ensino secundário. Esses dados não são sempre exatamente comparáveis entre países, mas é notável que no Chile essa proporção seja de três para um e que a Coréia gaste com um estudante do ensino superior praticamente a mesma quantia que gasta em um aluno do curso secundário.
No Brasil, a maioria dos alunos nas universidades públicas, principalmente nas faculdades que levam às carreiras mais prestigiosas, provém de famílias relativamente abastadas.
Uma manifestação desse fenômeno é a alta fração de alunos nos melhores cursos de medicina que estudaram em escolas secundárias particulares. Mas mesmo aqueles que vieram de meios mais modestos ganham muito ao freqüentar a faculdade. Cada ano adicional de educação superior aumenta o salário, na média, em 20%. Ainda que se leve em conta que o estudante de faculdade começa em geral a trabalhar mais tarde, investir em educação superior tem uma excelente taxa de retorno.
É verdade que alguns alunos não têm recursos para pagar uma anuidade adequada, mas o diplomado de uma faculdade pública poderia pagar depois de formado uma parte dos custos da sua educação.
É certo que há casos em que um ex-aluno ganha pouco. Mas isso pode ser resolvido fazendo do pagamento uma função da renda do diplomado. A Austrália, país que tem adotado políticas inovadoras no setor público, faz exatamente isso. Um aluno de faculdade pública na Austrália é responsável por uma anuidade que varia de acordo com o curso. A mais baixa, 3.847 dólares australianos (um dólar australiano vale US$ 0,75), é para cursos que o governo determinou como prioritários e que levam a carreiras pouco lucrativas, como a enfermagem. Estudantes de medicina pagam mais de o dobro.
O aluno pode pagar a anuidade à vista com desconto ou tomar um empréstimo. Após a formatura, a amortização é feita com o Imposto de Renda. A cada ano, o ex-aluno deve amortizar uma porção da dívida que equivale a uma proporção progressiva do seu rendimento. Se a renda anual é inferior a 38.147 dólares australianos, nada é devido. Mas da porção de renda que exceder 70.847 dólares o ex-aluno deve dedicar 8% para amortizar a sua dívida. Um profissional que ganhe bem liquida a dívida em pouco tempo. Um outro que ganhe menos demora mais. Como não incidem juros sobre a dívida, que é apenas corrigida pelo índice de preços ao consumidor, é mais vantajoso pagar mais devagar, e, portanto, o ex-aluno que tiver menor renda receberá um subsídio maior.
O programa funciona desde o final da década de 80 e todos os pagamentos são usados para financiar as universidades públicas. Hoje, essa fonte representa 16% do orçamento das universidades públicas e é equivalente a 40% das contribuições do governo central. Quando foi proposto, muitos temiam que os custos administrativos fossem excessivos, mas na realidade totalizam menos de 3% dos pagamentos anuais.
O Brasil precisa encontrar novas fontes de financiamento para expandir e melhorar a educação em todos os níveis. Os alunos dos estabelecimentos de ensino superior privados já custeiam os seus estudos. Os que se beneficiam da universidade pública devem começar a contribuir.

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