Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 30, 2006

João Ubaldo Ribeiro Überrauschungen?- Jornal O Globo

Não, não estou tentando xingar ninguém com esse título, que quer
dizer “surpresas?” em alemão. Isto porque está todo mundo procurando
surpresas nesta Copa e creio que não houve realmente nenhuma, com a
possível exceção de Portugal contra a Holanda.

De fato, o time de Felipão überrauschungou na raça os europeus
(Portugal não é considerado muito europeu, principalmente pelos
nórdicos), que esperavam a tão protelada demonstração de que o
futebol holandês é uma das maravilhas do mundo e os portugueses
jogavam apenas mais ou menos — e isso no tempo de Eusébio, quando
desclassificaram o Brasil na Copa de 66.

O mundo, contudo, dá muitas voltas — não sei se vocês já ouviram esta
sábia afirmação. Pelo que ficou demonstrado aqui, os holandeses estão
cada vez mais uma lembrança do passado distante e hoje não passam de
uma equipe medíocre e, o que é pior, com jogadores que escolheram o
esporte errado e deviam estar disputando essas lutas-livres em que
vale até dedada no olho ou em outras partes delicadas do corpo
humano. Na curta e remota era de Cruyff, tão remota que tenho certeza
de que muitos jovens não reconhecerão seu nome e recorrerão à memória
de vovô, eles jogavam bonitinho, mas não ganharam nada de realmente
significativo.

No seu jogo de hoje, os alemães, a julgar pelo que andam alardeando,
alguns sem muita elegância e com alguma empáfia, terão uma grande
Überrauschung, se os argentinos ganharem. Não lembro qual deles disse
com ares condescendentes que foi muito azar dos argentinos pegarem a
Alemanha nesta fase, porque serão esmagados implacavelmente. Ignoro
de onde ele tirou essa convicção, pois ela está com o time
arrumadinho (mais ou menos), mas argentino, como sabemos nós, nunca
deu moleza para ninguém e futebol não pode basear-se em estatísticas,
ainda mais quando limitadas.

Torço pela Alemanha, no jogo daqui a pouco. Não só porque me
emocionaria ver uma final do Brasil com os donos da casa e gosto do
país, onde já morei e tenho muitos amigos, mas, principalmente,
porque argentino tem know-how de jogar contra o Brasil e o Brasil,
com razão, sempre respeita bastante os times deles. Mas não terei
surpresa nenhuma, se a Alemanha tomar uma bela traulitada argentina,
como, aliás, acho que vocês tampouco terão.

Surpresa mesmo seria a Itália, apesar do futebol sem brilho que tem
apresentado, perder da Ucrânia, em cujo jogo contra a Suíça, parecia
que ninguém ia fazer gol nem nos pênaltis e passaríamos horas
esperando alguém enfiar a bola numa rede. Surpresa, mas não
impossibilidade. Desde 1950, aprendemos, definitiva e dolorosamente,
que futebol se ganha é no campo. E, por enquanto, esse pessoal está
achando que ganha no gogó. Überrauschung neles.

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