Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 27, 2006

A importância do livre comércio



artigo - Por Ian Pearson
Valor Econômico
27/1/2006

Há necessidade de avanços em todos os capítulos na Rodada Doha, não apenas em agricultura

O comércio importa. Conhecemos bem a história: o comércio internacional sustenta milhões de empregos em todo o mundo; fomenta setores industriais que valem bilhões de dólares; abre oportunidades para pessoas e famílias em centenas de países de todo o mundo. E, na era da globalização, vem ganhando ainda mais importância. As cifras do comércio total realizado no ano 2000 foram mais de 20 vezes o nível registrado em 1950.

É por isso que a Agenda de Desenvolvimento de Doha e as negociações ora em andamento para tornar o comércio mundial mais livre e mais justo são tão importantes.

Admito que saí de Hong Kong, em dezembro, um pouco decepcionado com o resultado da reunião ministerial. Apesar de todo o grande interesse pelo comércio em 2005, os avanços continuaram lentos. Havíamos esperado originalmente que em Hong Kong fossem estabelecidas as condições para uma conclusão das negociações que fosse ambiciosa e propícia ao desenvolvimento. Porém, logo ficou claro que os membros da OMC discordavam em demasiadas questões para darem os passos ambiciosos que queríamos.

Então, reduzimos a escala de nossas ambições e procuramos assegurar os avanços já alcançados, construir um pacote de desenvolvimento significativo e aproveitar a conferência como trampolim com vistas ao sucesso da rodada neste ano.

E, com efeito, alcançamos um avanço limitado em algumas áreas - de modo que, embora as conversações de Hong Kong não tenham sido exatamente bem sucedidas, elas também não foram um fracasso. Entre os avanços inclui-se o acordo para a eliminação de todos os subsídios a exportações na agricultura até 2013 e um pacote de desenvolvimento que contempla medidas destinadas a propiciar acesso isento de impostos alfandegários e de quotas para os países mais pobres, a Assistência para o Comércio, bem como algum avanço com relação ao algodão. São medidas válidas, porém não na escala necessária para transformar as oportunidades para muitos dos países mais pobres do mundo.

A conquista final da ministerial de Hong Kong foi o acordo quanto a uma trajetória para se concluir a Agenda de Desenvolvimento de Doha este ano, ficando as modalidades para o final de abril e os cronogramas para o final de julho. Todos nós precisamos centrar a atenção nessas metas à medida que as discussões forem retomadas com maior intensidade. E o Brasil, encabeçando o G-20, tem um importante papel a desempenhar.

Então, o que precisamos fazer? O desenvolvimento deve continuar no cerne de todas as negociações e os países em desenvolvimento devem receber uma parcela justa dos benefícios gerados. Parte da solução consiste em que os países desenvolvidos revertam práticas que dificultam a concorrência dos países em desenvolvimento, tais como subsídios a exportações e outros tipos de proteção à agricultura.

Outra parte consiste em concentrar a atenção em áreas de particular interesse para as exportações dos países em desenvolvimento. E uma outra parte consiste em dar aos países menos desenvolvidos a flexibilidade para planejarem suas próprias estratégias econômicas e ajudá-los a desenvolver a capacidade de participarem plenamente do sistema comercial global.

É essencial que os membros da OMC demonstrem a flexibilidade necessária para levar adiante as negociações, inclusive o G-20 e o Brasil

Nesse processo, também devemos nos lembrar dos ganhos de que os países em desenvolvimento podem desfrutar a partir da liberalização de seus próprios mercados.

Conforme afirmou o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, o desafio é claro: podemos fazer o comércio funcionar para todos nós? Precisamos de um acordo de amplo alcance para derrubarmos as barreiras ao comércio nas três principais áreas: agricultura, acesso a mercados não-agrícolas (Nama) e serviços. A fim de romper o impasse, deve haver mais progresso nos cortes em tarifas industriais e liberalização de serviços, com a flexibilidade adequada para os países em desenvolvimento que precisam seqüenciar seus compromissos de acordo com suas necessidades de desenvolvimento.

A necessidade de avanços em todos os capítulos é clara. Para colhermos todos os benefícios da Agenda de Desenvolvimento de Doha, ela não pode ser uma rodada unicamente sobre agricultura. Reconhecemos que a agricultura é a força motriz da rodada, mas também é preciso que haja avanços em serviços e Nama.

Todos precisamos dar para receber. Nama e serviços precisam produzir acesso real a novos mercados nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento avançados.

Em todas essas negociações devemos ter presente o prêmio que se nos oferece: ganhos globais em potencial da ordem de US$ 200 bilhões.

É importante que os membros da OMC mostrem a flexibilidade necessária para levar adiante as negociações, inclusive o G-20 e o Brasil. Particularmente porque o Brasil obterá ganhos significativos de uma rodada bem sucedida. Os benefícios para a economia global estão bem documentados e pesquisas realizadas por economistas do Banco Mundial sugerem que o Brasil tem grandes ganhos a auferir, possivelmente superiores a US$ 3 bilhões por ano, se conseguirmos implementar uma Agenda de Desenvolvimento de Doha ambiciosa.

Esses ganhos têm grande probabilidade de ser compartilhados por grupos de renda mais baixa, contribuindo, assim, para retirar mais famílias da pobreza. Isso, além de apresentar o Brasil como um país aberto, dinâmico e cada vez mais desenvolvido e próspero, certamente é um prêmio pelo qual vale a pena lutar. Como membro e líder do G-20 de países em desenvolvimento, o Brasil tem um grande papel a desempenhar no sentido de ajudar a conduzir a rodada a uma conclusão bem sucedida e favorável ao desenvolvimento. É do interesse de todos nós.

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