Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, dezembro 29, 2005

CELSO MING A âncora da economia

OESP

 

Tanto quanto falhou em garantir o crescimento econômico, o governo federal foi bem-sucedido no combate à inflação e na blindagem da área externa.

Ontem, o Banco Central divulgou o Relatório de Inflação, um documento de 144 páginas por meio do qual presta contas trimestrais da administração da política de metas. Lá ficou clara a terceira redução anual consecutiva da inflação e o cumprimento, pelo segundo ano seguido, da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional.

O diretor de Política Econômica do Banco Central, Afonso Bevilaqua, apontou depois as boas novas na área externa: só em dezembro (até dia 27), o Banco Central comprou US$ 4 bilhões em moeda estrangeira e as reservas atingiram US$ 53,8 bilhões.

O Banco Central interveio no câmbio de maneira diferente durante o ano. Em março suspendeu as operações para retomá-las em setembro. No período, comprou US$ 27,3 bilhões. Se, em 2006, comprar o mesmo volume comprado em dezembro, ao final do ano terá acumulado mais de US$ 75 bilhões. Esses números não incluem os US$ 5,6 bilhões arrematados pelo Tesouro em 2005 e nem os US$ 5,8 bilhões que comprará em 2006.

Reservas altas são couraça para os tempos de guerra eleitoral, sempre sujeita a lances de selvageria política.

Os cada vez mais estridentes críticos da política econômica do governo não dão importância a esses sucessos. Dizem que está tudo errado porque a economia cresceu uma insignificância (o que é verdade), talvez não mais do que 2,5% ao longo do ano; e que os juros são indecentes (o que também é verdade).

Embora falte muito para o ajuste fiscal, outro flanco frágil, não dá para negar que está em curso um processo de arrumação da economia que haverá de ter impacto positivo à frente.

A política monetária (de juros) está sob fogo cerrado. Mas é preciso distinguir as críticas. A maioria está centrada no erro de dose do Banco Central. Poderia não ter ido tão longe no arrocho monetário e, depois de ter chegado lá, poderia ter cortado mais os juros. Mas estas são críticas ao ajuste fino e não à qualidade do sistema. Se houve exagero na dose é claro que houve erro, mas, nesse caso, os juros podem cair mais depressa.

Críticas mais relevantes dizem respeito à própria natureza da política de metas. Há os que entendem que esse sistema está errado porque não leva em conta a necessidade de crescimento econômico: "Não basta combater a inflação; é preciso assegurar a expansão do consumo e do sistema produtivo."

Há os que defendem uma administração mais frouxa do cumprimento das metas: "Tudo bem se houver estouro de três pontos na inflação que podem ser atacados quando houver melhores condições de produção."

Há os que criticam não o sistema, mas a fixação de metas baixas demais de inflação, que exigem mais sacrifício da sociedade para serem cumpridas.

E há aqueles para os quais sistema de meta de inflação só funciona em países civilizados e pequenos, como a Nova Zelândia (onde foi criado), mas não no Brasil, que tem uma economia com tantas distorções e com tão má distribuição de renda.

A questão do ajuste fino é discutível. Mas juros um ou dois pontinhos mais baixos não teriam, por si só, assegurado um crescimento econômico muito melhor do que o atual.

Estão abertas as discussões para o aperfeiçoamento do sistema de metas, que ainda não completou sete anos e está longe de ser perfeito num País em que a própria metodologia de medição da inflação é questionável.

Mas ainda não inventaram nada melhor para ancorar a economia num ambiente de câmbio flutuante e livre fluxo de capitais. Em todo o caso, quem tiver idéia melhor, que a apresente.

ming@estado.com.br

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