Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 27, 2005

Roberto Pompeu de Toledo Huummm... Uau! Chi... Eureca!

VEJA

Do Brasil de Lula aos EUA de Bush,
são muitos e variados os motivos
para exclamações

Huummm... O "huummm" é uma imprescindível ferramenta, no estoque dos murmúrios e exclamações. Expressa uma mistura de dúvida com reticência, incredulidade com desconfiança. Na semana passada, uma missão do governo brasileiro, chefiada pelo embaixador Manoel Gomes Pereira, e composta ainda de um representante do Ministério da Justiça e um do Ministério Público, andava para cá e para lá, em Londres, batendo à porta de órgãos policiais, defensores dos direitos humanos e da comissão incumbida de investigar a morte de Jean Charles de Menezes, o mineiro assassinado pela polícia britânica. O objetivo? Bem... Informar-se, exigir apuração de responsabilidades, coisas assim. Huummm...

O governo brasileiro precisava mandar uma missão especial para esse fim? Não que seja reprovável seu interesse pelo assunto. Pelo contrário, tem o dever de preocupar-se com a sorte dos brasileiros no exterior. Mas o Brasil mantém em Londres uma embaixada e um consulado. Eles poderiam, até com mais vantagem, conhecedores que são, por dever de ofício, ou que devem ser, dos meandros da vida britânica, desincumbir-se da tarefa. Mas... Claro, uma missão especial é mais vistosa. Garante uma cobertura de imprensa que as representações permanentes, por operar numa base mais rotineira, nem sempre atraem. Huummm... Fica a desconfiança de que até à tragédia de Jean Charles não se poupa o padrão Duda Mendonça de governança marqueteira. Ainda mais que quem cuida do assunto é o Itamaraty, recanto do governo tão chegado à marquetagem quanto a uma coleção de fracassos que vai de derrotadas candidaturas a órgãos multilaterais a "alianças estratégicas" com países que lhe passam a perna.

Huummm... Se o leitor viu o anúncio do governo convocando para a campanha de vacinação contra a paralisia infantil, vai concordar que também merece um "huummm". Como pano de fundo apareciam alegres bebês brincando com uma bola, um bonito filme que, vai dito de passagem, deve ter custado um bom dinheiro – mas marcante, mesmo, foi a atuação do ministro da Saúde. Enquanto os bebês evoluíam, ele, em primeiro plano, fazia um discurso cheio de ternura, com graciosas entonações de voz. Huummm... O ministro... Como se chama ele mesmo? É um tal de entra-e-sai no governo... Ah, sim, Saraiva Felipe (será que está certo? ou ele tem se apresentado com nome e sobrenome invertidos?)... O ministro foi chamado de "fofo" na coluna de Ancelmo Gois, no Globo. O governo Lula nos apronta cada surpresa!

Uau!!! Estamos agora diante de uma exclamação bem diferente. Se o "huummm" se dá num diapasão discreto e sutilmente irônico, o "uau" é uma aberta expressão de admiração, de surpresa, de júbilo. Vem do "wow" do inglês. O ex-ministro José Dirceu tem dito e repetido que os adversários não estão atrás dele, e sim do que ele significa. Uau! Que significa José Dirceu? Sabe-se o que Lula significa, o que Brizola, Ulysses ou Tancredo significaram. Sabe-se, para lembrar a mais preciosa flor do orquidário do ex-ministro, o que Fidel Castro significa. Já Dirceu... Os jovens inventaram um novo jeito de se referir às pessoas com alto conceito de si mesmas. São pessoas que "se acham", forma abreviada de "se acham o máximo". Uau! Como se acha, esse Dirceu! Até merece congratulações, pela auto-estima lá no céu, em meio à tormenta.

Chiiii... O "chi" exprime perigo. Emprega-se quando as coisas ficam feias, e, para dar uma folga ao governo Lula, vai dedicado a George W. Bush. Escândalo não foi o pastor Pat Robertson ter recomendado o assassinato de Hugo Chávez. Robertson é um notório maluquinho da direita religiosa, que já disse disparates semelhantes. Escândalo foi o Departamento de Estado ter classificado a recomendação do pastor de "inapropriada". Inapropriada? A reação cairia bem nos lábios de um mordomo inglês a exibir seu domínio do understatement, a arte, tão característica de sua nacionalidade, de conferir um cômico abatimento ao real peso do que se quer dizer. Já num governo que se diz em guerra de vida ou morte contra o terrorismo – chiiii –, é assustador. Dá margem à conclusão de que o governo americano faz uma exceção ao terrorismo a favor.

Eureca! Será que alguém ainda se lembra do "eureca"? Quer dizer "achei", "descobri", "encontrei a solução". A explicação é dedicada aos jovens, a quem a palavra deve soar tão enigmática quanto "caluda" ou "homessa". Eureca! Há solução para a missão especial do embaixador Manoel Gomes Pereira. Não é de esperar que, em Londres, ela tenha êxito em apressar as investigações em torno do assassinato de Jean Charles, nem que tenha o condão de agitar o assunto mais do que já está agitado na opinião pública inglesa. Mas, no Brasil, se voltada para os casos nacionais de mortes praticadas pela polícia, aí, sim, encontraria um campo de atuação muito mais fértil, e muito mais carente de seus bons ofícios. Temos inclusive casos de estrangeiros, como o do chinês que morreu sob tortura depois de preso no aeroporto, não faz muito. Aqui, sim, a missão teria tarefa útil a desempenhar.

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