Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, julho 28, 2005

Alberto Tamer China se embaralha para dizer não

O Estado de S Paulo


Em declaração escrita classificada como "solene", o banco central da China desmentiu a interpretação de que a valorização do yuan, autorizada na semana passada, "não é o início de um processo". Nada mais vai mudar. "Isso certamente não significa que o ajuste de 2% do remninbi (outro nome do yuan) é o primeiro passo que permitirá novos ajustes", disse o banco central chinês. Ele culpa a mídia estrangeira pelas "interpretações errôneas" que favorecem a especulação.

O que o banco não diz é que, se houve especulação e interpretações errôneas, isso se deve ao próprio governador do banco central, Zhou Xiaochuan. No último sábado, ele foi muito claro - ou melhor claro demais para o governo - ao dizer textualmente: "Nós fizemos um ajuste inicial para o nível de 2% da taxa." A palavra "inicial" estava lá. Até Alan Greenspan, presidente do banco central americano, aplaudiu dizendo que "é certamente um primeiro bom passo".

Para reforçar ainda mais o deslize (será?) do governador do Banco do Povo ( o banco central chinês), o presidente Hu Jintao foi à televisão - sim, à televisão! - para declarar que a China vai manter "uma política fiscal e monetária firme".

ESTÃO SEGUROS, MAS CONFUSOS

Parece que as autoridades chinesas estão seguramente confusas... Desacostumadas a lidar com a imprensa livre, estão enfiando os pés pelas mãos. Primeiro, não há dúvida de que as palavras "ajuste inicial" foram pronunciadas pelo governador do banco quando anunciou a valorização do yuan. Os analistas e a imprensa especializada estrangeira nada mais fizeram do que tirar conclusões. E a especulação correu solta, com investidores esperando ganhar com um ajuste.

EXPORTAÇÕES EXPLODEM

Para confirmar essa confusão, no mesmo momento em que o Banco Central jurava solenemente que não haveria outra valorização de sua moeda, o jornal oficial do Partido Comunista, International Business Daily, publicava uma outra notícia no mínimo inoportuna para a China, neste momento.

O Ministério do Comércio acredita e prevê que o superávit comercial da China com os Estados Unidos passará de US$ 90 bilhões, neste ano. Mais: US$ 60 bilhões com a União Européia! Citando nominalmente o vice-diretor do ministério Huo Jianguo, o jornal informa que "as exportações, neste ano, aumentarão mais de 25%, enquanto as importações 15,1%". Ou seja, o yuan mesmo valorizado em 2% ante o dólar continuará favorecendo as exportações chinesas, acumulando superávits e reservas cambiais gigantescas. E a China não pensa em alterar isso.

VIAGEM SEM ESPERANÇA

O governo dos EUA continua cauteloso e pressionando a China para mais ajustes. "Vamos resistir a todas as pressões", afirma o governador do banco central chinês. E acrescenta: "A valorização feita na semana passada é uma espécie de esponja que possibilita enfrentar, sem dor, a pressões dos especuladores."

Essa declaração foi feita antes da chegada a Pequim do enviado especial americano Olin Wethington. É a sua quarta viagem em algumas semanas. Oficialmente, ele "está indo para que possamos entender melhor o que a China está fazendo e pretende fazer a curto prazo.

ATÉ ONDE A CHINA PODE RESISTIR

Em meio a tantos dizeres e desdizeres, a pergunta é até onde a China poderia resistir a essas pressões. Por muito tempo, um tempo imprevisível. Fernando Pinto Ferreira, da Global Invest, em sua última análise da questão, enumera os fatores de resistência chinesa.

"A análise fria nos leva à conclusão de que não há motivação lógica para crer que a China esteja caminhando para um regime cambial flexível ou que permita uma apreciação razoável do yuan."

Não seria uma repetição do que já houve no Leste Asiático no passado, inclusive no Japão? "Devemos lembrar que o sucesso chinês tem três elementos básicos, que são a mão-de-obra, a baixa carga tributária e a moeda valorizada, todos conspirando para permitir um custo de produção incomparável entre as grandes economias do mundo."

Esse mesmo modelo aplicado em outros países só mostrou sinais de perda quando o enriquecimento proporcionado por ele encareceu o custo da mão-de-obra limitada.

E, com certo humor, Fernando Pinto Ribeiro conclui: "Se você concorre com um chinês, há duas opções: a primeira é continuar lutando, cortando custos, melhorando a qualidade, fazendo o que for possível. A outra opção é aguardar por outras valorizações do yuan. Neste caso, puxe uma cadeira..."

Resumindo, a China muda o câmbio se quiser pois acumulou reservas de US$ 700 bilhões, que continuam aumentando a cada mês, e dispõe de um exército, de pelo menos 500 milhões, de mão-de-obra ociosa e barata. Nenhum país jamais esteve nessa conjuntura de fatores tão favoráveis.

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